quarta-feira, 16 de abril de 2008

VERÔNICA DE VATE: FLORISVALDO MATTOS

CELEBRAÇÃO POÉTICA
Por Cleberton Santos

Foto: Ricardo Prado
Florisvaldo Mattos (Uruçuca, 8 de abril de 1932) iniciou sua criação poética ainda na adolescência quando publicou no jornal A Voz de Itabuna e no Diário da Tarde de Ilhéus. Depois prosseguiu para Salvador, dando continuidade à sua carreira literária ao publicar, por volta de 1956, seus poemas na revista Ângulos. Mas foi na revista Mapa que o escritor grapiúna consolidou sua presença literária na Bahia da época.
Em 1962, Florisvaldo Mattos participou de uma importante antologia da novíssima poesia brasileira organizada pelo poeta e crítico Walmir Ayala, na qual afirmou o antologista: ...alto e maduro discurso de justiça. Generoso como a própria Bahia, seu verso denso trepida de sensuais proparoxítonas. Canto vestido de couro, com um laivo de ódio e um gesto de revanche. Resistência poética da melhor qualidade em nossa novíssima poesia.[i]
Com o lançamento do seu primeiro livro Reverdor (1965), volume de poemas de temática agrária, recebeu as palavras incentivadoras do romancista baiano Jorge Amado, num artigo publicado no Suplemento Dominical do Diário de Notícias (31 e 01 de novembro de 1965, Ano XC, Nº 19668, Salvador / BA, p. 02.), do qual transcrevemos um pequeno trecho: Tão trabalhado e obtido em sua busca, tão realizado em sua forma de evidentes exigências e duro labor, denso de um conteúdo vegetal e agrário, sendo livro de nosso tempo e nossa realidade, “Reverdor” situa de imediato e de vez, o poeta entre os primeiros de sua geração e não deixa momento de dúvida sobre sua vocação e sua permanência nos quadros mais altos de nossa poesia.
No ano de 1975, publicou seu segundo livro Fábula civil, reunião de poemas de tonalidade urbana, mas ainda com a presença do mundo campesino. Em 1995, tomou posse na Academia de Letras da Bahia, na cadeira nº 31, e na oportunidade foi saudado pelo poeta e acadêmico João Carlos Teixeira Gomes que pronunciou as seguintes palavras: A Academia de Letras da Bahia acolhe hoje com satisfação e honra um dos mais representativos intelectuais da sua geração, Florisvaldo Mattos. Iluminado pelo dom da palavra escrita, tem sabido usá-la para destacar-se como jornalista e como poeta, em ambas essas atividades imprimindo marcas de um vigoroso talento.[ii]
Publicou, através do Prêmio Copene de Cultura e Arte, o livro A caligrafia do soluço & poesia anterior (1996), com ilustrações do artista plástico Calazans Neto, editado pela Fundação Casa de Jorge Amado. Neste livro o poeta reuniu poemas dos seus dois livros anteriores e aproveitou para publicar os seus primeiros textos, escritos entre 1953-1954, com o subtítulo de Noticiário da Aurora. Nas orelhas desse livro, escreveu João Carlos Teixeira Gomes: Alta poesia, em suma, de requintada fatura, de um dos poetas mais importantes da sua geração, na Bahia ou no Brasil. Pela riqueza de certos processos metafóricos um construtor de verdadeiros prodígios verbais.[iii]
Em 2000, publicou Mares anoitecidos, no qual o autor conjetura, em clave épico-lírica, sucessos e desventuras da presença dos holandeses na Bahia. Sobre esta obra, o acadêmico Ruy Espinheira Filho afirmou: Nestas novas composições, como em outros momentos de sua aventura literária, Florisvaldo Mattos exerce com mestria sua épica e sua lírica (as quais, repito, às vezes se dão em amálgama), cantando lugares e gentes da sua vivência, da sua afetividade, e, poderosamente, celebrando armas e barões assinalados, cujo sangue e sonhos coloriram um terra e uma era – e colorem hoje, como se no calor da hora, uma grande e luminosa literatura.[iv]
Em 2001, publicou Galope amarelo e outros poemas, uma seleção feita por Ruy Espinheira Filho e lançada no projeto das comemorações ao Centenário de Nascimento do Poeta Sosígenes Costa. Em resenha de jornal, manifestou-se o escritor e crítico paranaense Miguel Sanches Neto: Publicado mais na Bahia, e só isso justifica não ter um nome nacional, Florisvaldo Mattos (1932) é um poeta requintado, com um verbo a um só tempo claro e preciso, aliando assim dois grandes modelos locais, a transparência do cordel e o domínio barroco da linguagem.[v]
Em pleno vigor poético e dono de uma obra em constante burilação, presente em várias antologias brasileiras e estrangeiras, este poeta baiano representa uma das mais importantes vozes da poesia brasileira contemporânea. E ao leitor cabe partir em busca do tesouro que é a palavra lírica de Florisvaldo Mattos:


ALERTA


A nenhuma parte
levará o caminho.

Nem ouves o canto das nuvens
nem a pedra tombada a teus pés.

Defines-te em teu enigma.
Em busca de outro limite
vagueias na penumbra
das inconclusas auroras.


FLORISVALDO MATTOS


Cleberton Santos é poeta, crítico literário, mestre em Literatura e Diversidade Cultural e professor de Literatura Brasileira da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).

[i] AYALA, Walmir (org.). Antologia da novíssima poesia brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Cadernos Brasileiros, 1962.
[ii] GOMES, João Carlos Teixeira. Saudação a Florisvaldo Mattos. Revista da Academia de Letras da Bahia. Salvador, março, 1993, nº 43.
[iii] GOMES, João Carlos Teixeira. Um construtor de prodígios. In: MATTOS, Florisvaldo. A caligrafia do soluço & poesia anterior. Salvador: Fundação Casa de Jorge Amado; COPENE, 1996.
[iv] ESPINHEIRA FILHO, Ruy. Emoção e alumbramentos. In: MATTOS, Florisvaldo. Mares anoitecidos. Rio de Janeiro: Imago; Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 2000.
[v] SANCHES NETO, Miguel. Um mestre à margem. A Tarde, A Tarde Cultural, Salvador, 29 jun. 2002.

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