quinta-feira, 26 de agosto de 2010

PERFIL LITERÁRIO – JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO


Ouça, logo abaixo, a entrevista que Oscar D’Ambrosio, do programa Perfil Literário, da Rádio Unesp, fez comigo, no mês de abril, tendo como foco principal o meu livro Roseiral. Entrevista 677.

sábado, 21 de agosto de 2010

SANGUE NOVO - CLARISSA MACEDO



POESIA: TUDO O QUE VEJO E SINTO – CLARISSA MACEDO é estudante de Licenciatura em Letras Vernáculas, mas principalmente é poeta. Como tal, entende que “as “Letras” podem ser uma âncora ou uma vela”. Soteropolitana, nascida em 1988, mas residente em Feira de Santana, escreve poesias, contos e algumas crônicas. Tenta um romance a pequenas investidas. Dança, luta, almeja pintar e leva a música sempre consigo. Participa da Antologia do concurso Feirense de Poesia Godofredo Filho e do CD Volume III dos Poetas Feirenses. É poeta que busca a poeta que é, e em tudo o que ver e sente há poesia. Vejamos como é isso.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – O que é a poesia? Por que ser poeta?

CLARISSA MACEDO – A poesia é... sem muitas explicações. Quaisquer tentativas de explicá-la seriam uma incompletude. No entanto, o peito arfa em querer pronunciar que, para mim, a poesia é, também, parte de um viver no qual ela sempre penetra irremediavelmente. Em tudo o que vejo e sinto a poesia está lá, mesmo que timidamente, dando a sua consciência dolorosa e o seu afago discrepante e abrasador... Não sei se sou poeta em inúmeras definições. Acredito que o ser poeta ainda silencia traços que não se pode apalpar. Mas, sensitivamente, escrevo num desenfrear apaixonado. Não me lembro de viver sem o poetar, sem aquela inspiração sensorial que me invade e me leva. Ainda busco poeta em mim, me tateando, foge, volta...

JIVM – Como foi que a poesia chegou na sua vida? Quando foi que você se percebeu poeta?

CM – Não sei exatamente, mas me lembro de ter escrito alguns versinhos aos oito anos, e a face marejada da mamã diante do papel... O primeiro poeta que li foi Drummond e foi decisivo. Fiquei extasiada. Leio desde pequenina, e me dei conta de que sempre divaguei bastante, desde a infância, entre quimeras... A escrita e a poesia foram tomando forma e lugar em mim. Mas creio que estou me percebendo ainda, enroscada nas dúvidas jocosas e nos arrebatamentos soturnos.

JIVM – Quais são os poetas que mais lhe influenciam? O que anda lendo? E na prosa, quais os autores que mais lhe impressionam?

CM – Talvez diga os que mais me emocionam, o que é também uma influência. O Cruz e Souza, o Augusto, Baudelaire, Maiakóvski – com suas nuvens de calças, Drummond, Álvares, Rabelo, Bandeira, Rimbaud, Antero... Ler poesia é prazeroso e difícil, exige muito de mim. Sempre leio muitas coisas, misturo tudo. Nunca largo meus prediletos e procuro ler os colegas, meus contemporâneos, acho importante valorizar, de algum modo, aquilo que se faz hoje. Leio vários colegas escritores, como Julio Reis e Markus V. B. dos Santos. Tô curtindo esses dias um pouco de Nestor Perlongher, Osvaldo Lamborghini, Horácio Costa. Kafka e sua aterrorizante aflição que me direciona a buscá-lo, Machado e sua maestria, Torga, Clarice, Eça, Borges, Nelson e uns outros mais, ao ermo.

JIVM – Você é aluna do curso de Letras da Universidade Estadual de Feira de Santana. Em que medida ser estudante de Letras contribui para a sua poesia?

CM – Estudar é muito importante. Esmiuçar o que se gosta é ainda mais importante. Ser aluna do curso de Letras, quando entrelaçada profundamente com a Literatura, é perigoso. É necessário ter discernimento para não confundir as informações enriquecedoras, críticas prudentes com a verborragia trágica, o podamento bestial que cerca alguns. Conhecimento e banalidade andam juntos. Ler, ler, diminuir a ignorância, é um dos caminhos para se adquirir o precioso discernimento. Há uma metade duma meia dúzia de mestres que mostram uma boa trilha do conhecimento, e, sobretudo, ter papos desencanados com muitos colegas é essencial para uma formação, talvez, adequada. É uma luta infindável... As “Letras” podem ser uma âncora ou uma vela. É questão de decisão.

JIVM – Como anda a sua produção? Algum projeto para publicação de livro? E o que mais?

CM – Sou movida pelo sentimento, pela inspiração – esta vem quando quer. Na fase em que me encontro, ainda de profunda crise com a verdadeira escrita, estou tentando bastante. Não fico longe da escrita. Em alguns momentos eu afasto alguns versos intolerantes que me afligem, mas a poesia é insistente e penetrante. Alguns projetos existem. Os primeiros são referentes a um livro de poesias e outro de contos. Pretendo fazer algumas coisas que mesclem a pintura, a dança, a música – que também são grandes paixões em minha vida. Fazer arte, respirá-la, conhecê-la, amasiar-me com ela são projetos que sempre me ocorrem, me convocam. A jornada é, simultaneamente, trivial e surpreendente. No mais, uma vaga.

TRÊS POEMAS DE CLARISSA MACEDO




















CRISÓLITO


Era um homem nu.
Arrotado pelas têmporas do tempo
No acalento
Desdenhava de si, do outro
E do outro,
Aqueles lobos emoldurados
Em seus quintais.
Desenhando um traço,
Fino trato da rima perdida.
Caçando cachos de seu destempero
Em face do advento seu,
Nas pútridas petrolíferas,
Limpando as passadas,
Erguia seu tom negruminoso
E desconcertante,
Sente a pré raiz...
Suas tripas crispadas
De ontem,
Apenas lavadas
Por seu despertar salgado,
Exíguo e nédio,
Distorcem e quedam



LINHITA


Boi homem
Quer aquilo que não pode ter

Num Vesúvio
Mercenários reprimidos a espirrar

Sua chama fria...
Ecos a vaticinar clangores póstumos



VIOLÃO CHORADEIRO


Pousou abelha,
Doce ser de ferrões,
Na capa violeta
Do instrumento de cordas

Cordas de notas
Antigas e solitárias
Belas errantes
Da vida trivial –
A brevidade triste

Voou a abelha
Sem deitar seu instinto
Ouviu a melodia
Do acorde matizero
Anelagem soturna
Sofreguidão bonina

domingo, 15 de agosto de 2010

JIVM - FUNERAL


Foto: Ricardo Prado


FUNERAL


Assustadoramente toca o sino.
A morte, com seus ternos e tapetes
sensacionais, conduz, em caracóis,
dolentes multidões tão carregadas

de vozes que deságuam cemitérios.
Exposta a dor dos que ficam suspensos,
começam a florescer outros símbolos:
rosas brancas ressurgem nas lembranças.

Os pássaros da noite estão no vento,
vozes que vibram dentro do silêncio,
tumulto na frieza de uma lápide.

Na agonia de viver tudo morre.
E o mistério da vida desenvolve,
na morte, novas vidas em instantes.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

ESSA POESIA É PRA TOCAR NO RÁDIO

Por Ney Ferraz Paiva


1. a leitura

Lê sem ler, o que só é possível num certo de-lírio. [Jacques Derrida]

O inútil de fazer, segundo João Cabral de Melo Neto, vale mais que não fazer. Fazer está na ordem das debulhadas, fazer o pensamento pensar, fazer a escrita começar seu desconhecer – escolher seus escolhidos. José Inácio Vieira de Melo é um desses tais que vêm ao mundo pra não ter outras virtudes, que não as de poeta, o mais inútil dos fazeres. Por que outro motivo alguém se colocaria a cultivar rosas escarlates em pleno sertão – sem ter como manejar mais do que palavras? Ato de sensualidade, mostrar a escrita ao outro. Tocar, esfregar, afrontar. Múltiplos lances-movimentos que desejam trocas, reverberações de um sentir novo, aberto, total. Nada mais inútil, e não menos imoral, fazer frente aos narcisismos, às individualidades com a leitura. Instintivamente, o texto vai se adestrando no hábito de não se dirigir a ninguém, ou, por outro, de simular ao menos o receptor incauto. Se há uma escrita que escolhe, há uma voz que se quer ouvida, distinguida, ampliada, mesmo que por seu obscuro assovio. Josefina não canta, ela apenas assobia pior. É pela voz que o texto começa seu devir animal. Ler-escutar é uma metamorfose. E por esse duplo ato o poeta opera rebeliões entre dois mundos: o mundo irreal, o mundo cotidiano. Lança seus temas numa rede de repetições e variações intermináveis. Se de um lado enfatiza a literatura que circula nas comunidades centrais do sertão – literaturas bem menores que as menores, como cordel, cordões, reisados; de outro, se lança num circuito aberto de voo estético sem fronteira, que inclui Gertrude Stein, ecos de Carlos Drummond, o formalismo precioso e raro de João Cabral de Melo Neto, a essência marítima de fazer viajar as viagens em Herberto Helder e Gerardo Mello Mourão – tudo atravessado pelos ritmos inumeráveis a que aludiu Manuel Bandeira, e por isso mesmo arrisco dizer que ao fundo dessa poesia há lances embrionários de bossa nova, escutem, escutem, escutem... Mas que ninguém se engane: não se trata de uma escrita meramente submetida aos processos cultos dos grandes centros, de que muito se tem servido certa poesia desmunida de vigor e originalidade. A cópia sem o rigor dos ensinamentos, que se reduz à má sorte dos aprendizes sem talento, sempre entregues a itinerários determinados com antecedência. Música & escrita como que numa apresentação sussurrada, rouca e de assovios dissonantes, que talvez se pudesse tocar no rádio, como num delírio de escuta-e-leitura que manipulasse o sistema de recepção da poesia, quase nunca conflitante e alterado – convencional a não mais poder. Dos influxos do sertão às conjunções do ser-tudo, a poesia é convivência, vida comum, reimpressão dos caminhos dos homens a que Jorge Luis Borges bifurca, na ausência de mapas e atlas mais precisos, com o uso desproposital de um espelho e uma enciclopédia. José Inácio Vieira de Melo, algo que numa contraleitura dos lugares e paisagens a que se ajustam expectativas reais e sonhos de paraíso, movimenta sua poesia às direções remotas dos sentidos dos homens, aos seus desenfreados horizontes, às rotas empoeiradas a que uma suposta rosa-dos-ventos indicou o futuro – ou terá sido o passado? Com todas as variações e permutações iminentes.

2. o livro

Se um homem atravessasse o Paraíso num sonho, e lhe dessem uma flor como prova de que lá estivera, se ao despertar encontrasse essa flor em sua mão... o que dizer então? [Coleridge]

José Inácio Vieira de Melo, em “Roseiral”, empreende o ato de fazer o outro perceber/perceber-se nos duplos e nas transmutações de si: despertar “a vontade de plantar pedras em outras cabeças”, como consequência de uma linguagem que joga, brinca, viaja – e não se faz trocar por fichas neutras. Daí que, desde os poemas iniciais, o poeta evoca o retrato de cabeças como um gravurista que não se basta à representação. “Eu jogo uma pedra em tua cabeça para que ela cresça em dor”, ou: “A tua cabeça é um precioso amuleto dentro da minha cabeça”. A iconografia que o poeta quer é outra. Uma que fizesse circular um retrato que fosse o menos comum, do quanto que deste lugar existe, se é que existe o lugar e se pode falar por si ou de sua cópia, ou de seu vulto – e, assim, não mais ter que estampar uma mesma e única fisionomia no imediatismo precipitado da pergunta: o que é o sertão? Isto não mais. O retrato falado a que certo cinema, certa literatura, certa música não cessam de nomear, fixar. Uma sociologia que não se sabe se das artes, se das suspeitas, se das discriminações. Por certo nunca a das diferenças, das singularidades, das ramificações. Que esses clichês se abram em outros nomes-imagens não como buquês que ornam e celebram uma vida passivamente administrada; buquês que logo murcham nas mãos daqueles que já estavam mortos. Contra isto a potente investida dessa poesia multiplicada, transmutada, saída do silêncio e da solidão – num estrondo, numa pancada: “Para que, plantada em tua cabeça, a pedra frequente a tua existência”.
“Roseiral” tem como horizonte a amplidão. Requer conversa, diálogo, fala amigável, alegre e incessante. E isto é mais do que tentar uma ênfase. O livro todo nos afeta o imaginário com a vivacidade das coisas cuidadosamente feitas, e não arrefece o impulso de subida nas cinco seções em que se divide. Sem sacrificar a complexidade das temáticas, e sem cair na exterioridade do genérico, chega aos pontos de tensão em áreas de sensibilidade que pra muitos pareciam esgotadas, exauridas. Aqui, a “pedra”, a “rosa”, a “odisséia” – ou a viagem e o nomadismo – abrem espaço pra uma cena maior, de acentuada potência elocutória: um fluxo, um nascimento, uma torrente de coisas sendo devidamente despertadas em simetrias secretas. Não é mais o livro numa combinação híbrida de Rilke, Lorca, nem mesmo Celan, mas o livro inaudito. Um que se volta aos segredos como se de um álbum de família vertiginoso e nada dócil, de nomes-imagens travejados; livro que ativa toda a penúria que somos no instante impreciso das horas e descobertas. É o menino, a infância, a casa, o homem – aquele cadinho que somos, pra quem as coisas acontecem e, a uma só vez, escapam, multiplicam-se. “Eu não sei nem pra onde ir com a minha diferença”. O que somos é algo que criamos – somos nossa própria criação e não cessamos de fazê-la aqui e alhures. Formas de criação em linhas, trânsitos, direções fundamentais e intermediárias. Aventuras secretas e prazeres comuns. O aberto. O fechado. A favor disso o poeta adverte de seu modesto e imenso propósito: “E agora eu só sei te falar desse labirinto”.


Ney Ferraz Paiva é poeta, autor de Não era suicídio sobre a relva, 2000, e Nave do nada, 2004, ambos pela Fundação de Cultura Cidade do Recife.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

VERÔNICA DE VATE - HELENA ORTIZ


Fotografia: Natália Grill


Helena Ortiz nasceu em Pelotas-RS, é radicada no Rio de Janeiro. Poeta, contista, cronista e jornalista, criou e dirigiu, entre 1999 e 2005, o projeto Panorama da Palavra, uma mostra semanal de poesia. O projeto deu origem a um jornal mensal homônimo, que tem edição em papel e na internet (http://www.panoramadapalavra.com.br/), e também à Editora da Palavra, seu braço editorial.
Estudou no Instituto de Educação Assis Brasil e depois no Colégio Pelotense, onde foi aluna do escritor Aldyr Garcia Schlee. Na Faculdade de Direito venceu o primeiro concurso de contos de que participou, promovido pela Universidade.
Em 1969 mudou-se para o Rio de Janeiro onde ficou até 1974. Retornou a Pelotas e atuou como colunista do jornal Gazeta Pelotense, onde publicou os primeiros poemas e prestou concurso público para o cargo de taquígrafa da Câmara de Vereadores. Em 1985 prestou outro concurso, desta vez para a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, onde permaneceu até 1985. Em Porto Alegre foi editora da Rede Brasil Sul e colunista do jornal sindical da ALRGS. Freqüentou a Oficina Literária ministrada pelo escritor Luiz Antonio de Assis Brasil, na PUC, de onde resultou a publicação dos primeiros contos. Em 1997 publicou o primeiro livro de poemas Pedaço de mim, pela editora T&T, em memória da filha Alice.
Em 1985 prestou concurso para a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, freqüentou a oficina de poesia da Estação das Letras e publicou pela Ed. Blocos os livros Margaridas e Azul e sem sapatos, seguidos de Em par, em 2001, pela Editora da Palavra, que inaugurou a editora, e em 2005, Sol sobre o dilúvio. Durante esse período organizou o evento panorama da palavra, e além desse, que se tornou o mais conhecido, organizou outros em homenagem a Manoel de Barros, Garcia Lorca e Carlos Drummond de Andrade.
Reuniu, em 2009, os contos premiados em vários concursos, no livro O Silêncio das Xícaras.
Escreveu, em 2008 e 2009, o livro baseado em quê? volumes I e II, em defesa da legalização das drogas, e vai lançar, agora, em Maracás e Jequié o livro Poemas.
Mantém o blog http://www.integradaemarginal.blogspot.com/


*

Helena Ortiz vai participar do projeto Uma Prosa Sobre Versos, na cidade de Maracás, no dia 13, às 19:30 hs, no Auditório Municipal. No dia seguinte, 14 de agosto, estará em Jequié, onde participará do projeto Travessia das Palavras, na Biblioteca Central, às 19:30 hs. Os dois eventos contarão com a participação especial do Grupo Concriz. Em Maracás, além da participação do Grupo Concriz, o evento vai contar também com o Grupo Renascer, da cidade de Planaltino, e com o Grupo Tama Afro e Jorge Café.
No dia 18, Helena estará na Fundação Casa de Jorge Amado, no Pelourinho, como escritora convidada do projeto Com a Palavra o Escritor, que vai começar às 17 horas. O poeta Vitor Nascimento Sá é quem vai fazer a apresentação da escritora gaúcha.















INÚTIL PAISAGEM

Mi táctica es quedarme en tu recuerdo/
no sé cómo/ ni sé con qué pretexto/
pero quedarme en vos
Mario Benedetti


saber que bebes,
em pé, o café na padaria
e não pensaste em mim
desde que levantaste

olho pela janela (já conheces a paisagem)
Penso comigo: mais um dia a vencer

enquanto te esqueço
e me esqueces



POEMA DE ADEUS
A Idea Vilariño (1920-2009)


não vi o mundo
como sonhei
verdade que não

a era da felicidade esgarçou-se
ante o domínio de um deus novo
e obsceno

ficaram-me olhos e cadernos
mantenho-me à sombra


HELENA ORTIZ

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

SANGUE NOVO - RICARDO THADEU



SEMEADOR DE PALAVRAS – RICARDO THADEU é um poeta jovem. Bem jovem mesmo. Aos 20 anos publicou seu primeiro livro, D’ANTES. E agora, aos 21, já tem mais dois livros em andamento, o durantes e o Depois. Nasceu em Riachão do Jacuípe (03/06/1989) onde vive até hoje. É estudante de Letras com Língua Espanhola (UEFS), poeta, contista e cordelista. Começou a publicar os primeiros rabiscos no blog 100 Fundamentos (http://www.ricardothadeu.blogspot.com/). Apesar de morar em uma pequena cidade do interior da Bahia, Ricardo está antenado com os acontecimentos do mundo e, sobretudo com os escritores de seu tempo. Para Ricardo Thadeu “A poesia é a forma de expressão na qual encontro maior liberdade”. Vamos, então, conhecer esse poeta cheio de juventude, que vive a semear palavras.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO
– Ricardo Thadeu, aos 20 anos vc publicou seu primeiro livro, “D’antes”. Quando se deu seu contato com a poesia? O que representa a poesia na sua vida? E como aconteceu esse livro ainda em idade tenra?

RICARDO THADEU
– Eu tinha contato com a poesia desde criança. Depois que entrei na universidade e conheci alguns poetas como Lupeu Lacerda e Wladimir Cazé, por intermédio do amigo Georgio Rios, esse interesse se intensificou. A poesia é pra mim hoje a forma de expressão na qual encontro maior liberdade. Não vivo sem. A idéia do livro surgiu em 2008. Organizei um material do meu blog (100 Fundamentos) e submeti à revisão do poeta e amigo Roberval Pereyr. Depois, corri atrás da publicação que se concretizou no final de 2009.

JIVM – Como é ser um poeta de 21 anos em uma pequena cidade do interior da Bahia? Que relação as pessoas da sua família e da sua comunidade têm com a sua poesia? O que você pretende com sua poesia? Escreve por que e para que e para quem?

RT – Apesar das barreiras geográficas e de algumas limitações como a ausência de livrarias e de bibliotecas aqui em minha cidade, sigo escrevendo. Tento manter contato, pessoalmente ou pela internet, com conterrâneos meus que escrevem, como Caio Rudá. Minha família e meus amigos colaboram muito, compram os livros, ajudam a divulgar, lêem e me dão sugestões. Aí está o sentido da minha poesia. Semear palavras e, se possível, colher boas leituras. Por isso, escrevo para qualquer um que prepara seu campo para receber a poesia e não tenha medo de ficar com uma pulga atrás da orelha, é claro.

JIVM
– Que análise você faz da poesia contemporânea do Brasil? E da Bahia? Quais os poetas que mais lhe influenciaram? O que anda lendo, atualmente?

RT – Cara, tem muita gente boa por aí. É humanamente impossível acompanhar o mosaico da poesia brasileira contemporânea. Na Bahia, a quantidade poetas de alto nível impressiona. Falar de influência é complicado, mas acho que posso citar com segurança os poetas Drummond, Lupeu Lacerda (Entre o Alho e o Sal), Idmar Boaventura, Leminski, Luís Antonio Cajazeira Ramos, Roberval Pereyr e Bukowski. A influência é uma espécie de perseguição. A personagem de A lua vem da Ásia, de Campos de Carvalho, matou o professor de lógica aos 16 anos. Costumo dizer que tento matar cada poeta que já li até hoje toda vez que concebo um verso. Mas eles (os poetas) permanecem ali, no meu encalço. O último livro de poesias brasileiro que li foi o Debaixo das rodas de um automóvel, de Rogério Skylab. Os melhores dos últimos tempos foram o Roseiral (seu), o Macromundo de Wladimir Cazé e o Depois da Chuva de Georgio Rios.

JIVM – A internet contribui na criação poética e, por extensão, na criação artística, ou apenas serve para informar e divulgar? E os blogs, qual a contribuição que trouxeram para os escritores?

RT – Influencia claro. Os poemas e contos curtos que publico no blog, ou em livro, por exemplo, são, em parte, fruto desta rapidez, desta brevidade exigida no mundo virtual, mas o aspecto da divulgação também é muito importante. A internet possibilita também o contato com vários autores. Foi através dos blogs que conheci Renata Belmonte e Mayrant Gallo e me aproximei de Lupeu Lacerda. A própria revista Entre Aspas (onde conheci muitos escritores e leitores), hoje desativada, funcionava na plataforma de um blog. Visito vários blogs por dia. Leio, comento. Eles substituíram, em parte, os fanzines e deram voz a uma galera que talvez não fosse enxergada.

JIVM – E agora, poeta? O que vem pela frente? Um novo livro a caminho? Árvores plantadas? Filhos a nascer? E a nascente de seus versos, jorrando sempre? E o que mais?

RT – Depois do D’ANTES, percebi o quanto é importante interagir com outras pessoas do meio. Os próximos livros serão o durantes e o Depois. Junto com o D’ANTES, formarão o que eu chamei de A trilogia do tempo. A nascente está jorrando. Estou lapidando meus poemas, escrevendo muito, lendo bastante, conversando com os amigos para colher os frutos desta jornada que é a seara da literatura. Bem, o que vem pela frente é, sem dúvida, o caminho e seus percalços. O importante já foi feito: o primeiro passo. Deixo aqui o agradecimento pela oportunidade que você, Inácio, deu a mim e vem dando a esta moçada boa que está trilhando as sendas da poesia. Aos que lerem estas palavras, meu muito obrigado.

TRÊS POEMAS DE RICARDO THADEU





















DEIXA ESTAR, RAPAZ, DEIXA ESTAR
Para minha mãe


Quando estou na pior,
prestes a amarrar uma bigorna no pescoço
e me jogar da ponte
é você que me diz: let it be.
E quando eu quero correr pelado
e gritar para o mundo ouvir
que essa merda de vida não vale a pena,
é você que me diz: let it be.
E nas vezes que choro cortando cebolas
ou vendo meu time perder,
ou quando sei que os ETs
vão invadir a Terra,
que amanhã é segunda-feira
e percebo que essa é só uma leitura
de uma canção famosa
é você que me diz: let it be.



BILHETE NA GELADEIRA


querida F.,

vou ausentar-me por um tempo
o revólver está dentro da gaveta
os cadáveres estão no guarda-roupa
não se esqueça de alimentar o peixe

com amor,

R.



AUTOBIBLIOGRAFIA

o poeta é um fingidor:
assiste ao jornal nacional
e não vê desgraça,
vê poesia