segunda-feira, 5 de novembro de 2018

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO, ENTRE A ESTRADA E A ESTRELA - E VIVA WHITMAN!

Por Waldemar José Solha

José Inácio Vieira de Melo, Walt Whitman e Bob Dylan, andarilhos da poesia.

Uma inesquecível e deslumbrada leitura do poema BRASIL – de RONALD de CARVALHO – marcou-me os anos de adolescência, enquanto devorava os 18 volumes do Tesouro da Juventude, pois o poeta já começava com a empolgação herdada do americano:

"Nesta hora de sol puro 
palmas paradas
pedras polidas 
claridades
faíscas 
cintilações"

"Eu ouço o canto enorme do Brasil!"

Recentemente resenhei o excelente BABELICAL, do paraibano radicado em Brasília – mestre em literatura pela UnB, LEONARDO ALMEIDA FILHO – também com muito de Walt Whitman, sem qualquer angústia de influência. De repente recebo mensagem com a maravilhosa tradução, do IVO BARROSO, do EU CANTO O CORPO ELÉTRICO, depois de uma conversa nossa sobre o grande cantor da América. E FERNANDO PESSOA é ótimo, porém fica ainda melhor quando , assinando "Álvaro de Campos", escreve como o grande autor de LEAVES OF GRASS e suas três traduções ao gosto do freguês - Folhas de Erva, de Relva, de Grama.

E acabo de ler ENTRE A ESTRADA E A ESTRELA, que me comprova a felicidade enorme de Whitman de grassar fecundas rebentações em tantos poetas notáveis. O autor – alagoano radicado na Bahia – disse numa entrevista, que escreve “deitado em folhas de relva” e, nessa nova obra, apesar de afirmar que “agora, só quero ouvir Bob Dylan” – o poeta e compositor declaradamente na trilha whitmaniana – é bem mais Whitman do que ele.
Whitman, em toda biografia aparece como poeta, orador e andarilho. E talvez José Inácio seja o mais andarilho / de seus filhos, pois logo nos primeiros versos aborda pela vez primeira o refrão:

"O mundo foi feito pra gente andar.
(...)
E por mais que se percorra mundos,
por mais longe que se chegue,
mão haverá chegada, não haverá,
porque o mundo foi feito pra gente andar."

E isto é Whitman puro:

"No meu movimento, gentes, geografias,
diamantes, espinhos, auroras, crepúsculos."

E diamantes o leitor encontrará em cada bateia. “Sei que estou mais próximo de uma formiga / do que de uma estrela, mas só quero brilhar”. “A vida é leve quando as garças voam / sobre Sete Coqueiros / e abandonam a solidão no mar”. “Caminhar / até a padaria mais próxima / e comer um sonho que me leve à tua rua”. “Sou um país que vem correndo solto, / como um b arco a favor do vento”. “Tudo em mim reclama por outros mundos. / Tudo em mim clama fundo pelo desconhecido!”

Fascinam-me todos esses não-eus - whitmanianos poetas, soltos na buraqueira, vendo muita gente e muitos lugares - em versos tão livres quanto eles.


W J Solha é escritor, ator e artista plástico. Tem prêmios literários com romances e poesia; e com o filme O Som ao Redor recebeu o prêmio Guarani de melhor ator coadjuvante de 2012, prêmio igual no Festival de Cinema de Brasília, em 2013, por Era uma vez eu, Verônica. É seu o libreto da ópera Dulcineia e Trancoso, de Eli-Eri Moura, 2009; UNIRIO, 2017. É autor do quadro Ceia, do Sindicato dos Bancários da Paraíba, e do painel Homenagem a Shakespeare, da UFPB.