segunda-feira, 1 de novembro de 2010

TRÊS POEMAS DE GILDEONE DOS SANTOS OLIVEIRA


Ilustração: Juraci Dórea



















GUERNICA DE CANUDOS

“Mas eram terríveis lances, obscuros para todo sempre. Raro tornavam os que os faziam. Aprumavam-se sobre o fosso e sopeava-lhes o arrojo o horror de um quadro onde a realidade tangível de uma trincheira de mortos, argamassada de sangue e esvurmando pus, vencia todos os exageros da idealização mais ousada. E salteava-os a atonia do assombro...”
Euclides da Cunha, Os sertões.


Em ruflar de tambores
epopéicos,
versos disparam-se
de bambus encanados,
encenados
coitados.

Canudos-de-pito,
fumados em meio a ventos
de secas tardes
em sol esturricante,
assaltante.

Canudos-de-pito
em dispersão vertical
sorvem da terra
seu líquido
maternal.

A terra
faz-se homem
no seio de capuabas
acuadas do sertão.

Estilhaços de raios
solares e luminosos
queimam
constitucionalmente
a raça da favela.

Tambores ruflam pela charmosa estação
por Virgulino assaltada.

Pelos trilhos progressistas
maquinalmente exercitados,
constitucionais patriotas
pintam, furiosamente,
o sabor da fúria
de Macambira.

Em explosões de corpos
Homo humanus.
Animais.
A Matadeira
persiste
no furor mirabolante.


Do alto, o Belo Monte.
A fotografia
de pastos
secos
em cinza de sangue.
No mato,
resta a história,
loucura e glória
do titã cambaleante.

Na segunda margem,
Cocorobó
em choro flamejante,
entre rostos e restos
da derrotada história,
o açude apadrinhado
espera sua glória.

Entre conselhos,
Conselheiros,
o sertão margeia,
o mar
numa terceira sinfonia,
clama pela pedra
enterrada
na Guernica da Bahia.



MEU PLANETA


O meu planeta
é menor que um alfinete,
tem oceanos vastos,
e o continente é habitado
por belas sereias
que se banham
dentro da minha
flor vermelha.

É por isso que minhas estrelas
tocam sonatas de dor,
e a lua chora
toda noite, gozando de amor.



REVERSOS


O Sol despeja seus tentáculos
raiando sobre a terra esbraseada.
Riscos enxadescos pairam na poeira,
sobre a face do redemundo.

Destoco as fibras
nos versos encourados
que cavalgam o jumento
em reversos de Sol.

Pela caatinga branca,
asas revoam os pontos pretos
encharcados de bagaços.
No brinde das andanças,
cachaças florescem
as pegadas do curral.

Sob o cacto em espinhos,
tentáculos solares,
percorrem os pares
pelo mundo da pedra-flor.
Meus versos decantam o caminho
pisado em reversos de Sol.

2 comentários:

Anônimo disse...

Boa seleta ("Meu planeta" reverbera em quaisquer galáxias). Aquele abraço. T

Priscila de Freitas disse...

Imagens quase desenhadas. Muito bonito! Abraços