terça-feira, 1 de dezembro de 2009

SANGUE NOVO - LIDIANE NUNES



VONTADE DE FALAR ATRAVÉS DA ESCRITA – LIDIANE NUNES nasceu em Salvador, Bahia, em 1983. Com apenas três anos de idade, mudou-se para Feira de Santana, onde vive até hoje. É professora de literatura, graduada em Letras Vernáculas, pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e cursa, atualmente, a Especialização em Estudos Literários, pela mesma instituição. Mantém o blog: http://nuneslidi.blogspot.com/. Lidiane, singela e cristalina no falar e na escrita, é otimista e não tem pressa. Compreende que “um poema não conseguirá mudar o mundo, mas pode tocar um leitor, pode tornar alguém mais sensível, mais humano”. Vamos, então, conhecer um pouco mais dessa moça tímida que, quando sua voz quer calar, é dominada “por uma vontade de falar através da escrita”.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – Com tanta coisa legal pra se fazer por aí, por que escolher logo a literatura, e ainda mais a poesia, um ofício solitário, que não dá dinheiro nem visibilidade e, quando muito, desperta a inveja dos medíocres?

LIDIANE NUNES – Acredito que não foi uma escolha. Na verdade, quando me dei conta já estava apaixonada pela literatura, pela poesia. Decidi cursar Letras, porque gostava da área, mas foi na UEFS, durante as aulas de Mayrant Gallo, que descobri, de fato, a minha paixão pela arte literária. Comecei, então, a rabiscar algumas linhas - que nem ouso chamar de versos - sem pensar em ser escritora, em ter visibilidade, nada disso. Não nego que, hoje, penso em publicar. No início não. Escrevia apenas por um impulso, por uma vontade de falar através da escrita, quando a minha voz queria calar. Ainda continua sendo assim, com a única diferença de que agora não quero apenas falar (escrever), quero ser ouvida (lida). Nem que seja pelos meus poucos amigos e mesmo sem ganhar dinheiro. É como uma necessidade.

JIVM – A poesia serve para alguma coisa? O escritor – o poeta – desempenha algum papel na sociedade?

LN – No meu primeiro semestre de Letras, na disciplina Teoria I, discutiu-se sobre a função da arte, tendo como base textos de teóricos como Fischer, Faustino, Eliot, entre outros. Estes defendem que a arte possui quatro funções primordiais: a de prazer, deleite; a de aprimoramento da língua; a documental; e a de transformação social. Alguns colegas meus, até hoje, discordam dessa assertiva. Eu concordo, plenamente. Acredito que um genuíno poeta desempenha, sem dúvida, um papel na sociedade. Claro que um poema não conseguirá mudar o mundo, mas pode tocar um leitor, pode tornar alguém mais sensível, mais humano. E ainda que assim não fosse, pelo simples fato de nos despertar prazer, de nos permitir sentir de outra forma, a poesia valida a sua existência. Não consigo imaginar um mundo sem poesia, sem literatura, sem arte. Seria muito mais opaco. E vazio.

JIVM – Como é, de repente, se descobrir uma escritora? Olhar para trás e reparar o caminho difícil e doloroso que mulheres como Florbela Espanca, Marina Tsvetáieva e Emily Dickinson percorreram não lhe assusta?

LN – Ainda não me descobri uma escritora. Há algum tempo, estou começando a desconfiar. Sempre escrevia e deixava na “gaveta do computador”. Nunca mostrava a ninguém. Tinha um grande receio. Não sei bem do quê. Até que, certo dia, comecei a mostrar os meus escritos para alguns amigos. Eles elogiaram. Porém, para mim, eram suspeitos. Resolvi enviar meus poemas para Mayrant Gallo. Ele gostou de alguns, de outros não. Na semana seguinte, enviei mais um poema, que foi publicado em seu blog, na época, o Contramão. Fiquei muito contente. Segui escrevendo. Este ano, enviei um poema meu para uma amiga escritora e ela disse que eu tinha que perder o medo de publicar, que precisava me arriscar. Suas palavras me marcaram. Passei a postar alguns versos em meu blog e tenho recebido muitos comentários. Por isso, principio a me perguntar: será mesmo que levo jeito para a coisa? A resposta positiva me assusta, sim. O novo sempre me assusta. No entanto, não quero e nem consigo fugir. Então, vou me deixando ser levada, sem pressa...

JIVM – Você lê muito? Considera-se uma grande leitora? Quais são seus livros e autores referenciais?

LN – Leio muito. Amo o ato da leitura. Mas não sei se sou uma grande leitora. Cada dia que passa, percebo o quanto preciso ler ainda. Toda vez que converso com os meus amigos, que também gostam de literatura, saio com uma lista enorme de livros que não desbravei. Sei que ninguém pode ler tudo, entretanto, necessito organizar melhor o meu tempo. Sempre acho que tenho que ler mais. Meus autores referenciais são muitos. Sou apaixonada por Machado de Assis. Admiro bastante Clarice Lispector, Fernando Sabino, Mário Quintana, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Fernando Pessoa, Albert Camus, Kafka, entre outros. Atualmente, estou adorando ler contos. Ando fascinada por este gênero. Gosto de ler as obras de escritores baianos – ou radicados na Bahia – também: Renata Belmonte, Eliana Mara Chiossi, Ângela Vilma, Mônica Menezes, Mayrant Gallo, Gustavo Rios, Nívia Maria Vasconcellos, JIVM e outros. E tenho um vício chamado blog. Acesso este espaço quase diariamente. Posso ficar muito tempo sem atualizar o meu, mas não passo mais de um dia sem visitar os blogs dos meus amigos. A leitura, para mim, é essencial. Se não leio, sinto que está faltando alguma coisa. Então, me lembro o que é. E abro um livro. Na ausência deste, ligo o computador. Sem Internet? Entro em desespero.

JIVM – Você tem uma grande paixão pelo cinema. A sétima arte influencia de que maneira na sua produção poética?

LN – É, tenho mesmo uma grande paixão pelo cinema. E esta, também, foi influência do Gallo. Acho que o citei em quase todas as respostas. Inevitável. Ele é um eterno mestre e um grande amigo, que sempre me incentiva a continuar escrevendo e me indica bons livros e bons filmes. Depois que participei de uma oficina de cinema que ele ministrou na UEFS, passei a assistir aos filmes com uma visão diferente. Comecei a perceber que cinema é poesia, é metáfora, é arte, é uma das mais belas formas de narrativa. Mas não sei mesmo precisar a influência do cinema na minha escrita. Parece que percebo mais em relação ao assunto. Às vezes, assisto a um filme e, então, tenho a idéia de escrever um poema, um miniconto. Sempre adorei esse dialogismo entre as artes. No entanto, acredito ainda que o cinema me influencia na forma. Só não sei como. Na concisão, na fragmentação, talvez.

JIVM – Já tem algum livro esboçado? Quais os projetos? E o que mais?

LIDIANE NUNES – Não. Nenhum livro esboçado. Escrevo pouco. Tenho poucos poemas. Alguns minicontos. Nem sei se daria para publicar ainda. Fui convidada para participar de uma antologia de minicontos, prevista para ser publicada em 2010. Aceitei. Agora, estou aguardando. O meu único projeto, no momento, é continuar lendo, escrevendo, postando em meu blog e caminhando, sem saber exatamente para onde. No mais, gostaria apenas de agradecer muito pelo convite, pela oportunidade de participar da coluna Sangue Novo. E aproveito para deixar um forte abraço para os que acabaram de ler estas minhas palavras.

18 comentários:

Anônimo disse...

Brinque, Inácio, brinque com minha afilhada(rs). No mais, felicitações a Lidi pela bela entrevista e ao cavaleiro de fogo, ela generosidade em ceder o espaço. Aquele abraço.

T

Palatus disse...

Hoje te conheci mais profundamente, e se continuo lendo-te, ouvindo-te, auscultando-te, Lidi, passo a admirar-te ainda mais pela sensibilidade e tão doce maneira de ver o mundo e o Outro via arte. Se a ti teço um elogio, não é porque sou versado em arte, nem porque sou amigo teu, muito menos quero parecer um garoto educado, não é isso; é porque acredito sim que a arte pode mudar as pessoas, tocá-las; muitas vezes ela só preciso ser apresentada por alguém. E neste caso, Mayrant não só tocou a tua, influenciou-te a ver o mundo com outros olhos, mas ensinou-nos naquela época de faculdade a desconfiar dos homens quando - via arte -descobrimos que somos muito asquerosos, muito possível de atingir o que antes se julgava impossível. Eis porque sou apaixonado pelos contos dele: sempre que leio percebo o tênue limite entre a vida e a morte, um despencar de um prédio de muitas alturas e ao mesmo tempo não perder a oportunidade de ver a grandeza do universo e o sol que ilumina logo ali no longe. Tu és "um sangue novo", um belo sol que muito se vai, belamente, em nossas tardes, mas ressurgirá pela manhã mais viva todos os dias! Quero te ler folheando as páginas lentamente para sentir o prazer da leitura e guardar o livro na estante como quem guarda um pequeno tesouro. Um grande abraço destas terras paulistas...Dirijo meus parabéns pela excelente ideia do JIVM, sempre inovador. Nilson

Eliana Mara Chiossi disse...

Lidi,
parabéns.
E Inácio, se prepare porque Lidi tem sangue novo e algo muito raro, atualmente, uma certa reserva em relação ao caminho, uma certa timidez que julgo essencial. Sem a vaidade e sem a arrogância apressada, ela mostra que entende que havendo uma estrada, é preciso percorre-la, para vence-la.
Eu confio que a escritora Lidi Nunes está pronta, com os pés na estrada.

Abraços!

Georgio Rios disse...

Um pássaro é o que é esta Lidi, precisa com o que mais gosta:Ler/reler e fazer, boa poesia e boa prosa.Esta menina tem propriedade no que escreve e no que diz.E ela ,como eu já disse certa vez, tem muito a dizer!!!!!E Inacio, sem palavras para dizer o quanto é providêcial e generoso este espaço.Brilhando a cada Sangue Novo,a cada Post.

Mayrant Gallo disse...

Menina, embora pequena, você é grande! Victor Vhil aprovaria, e, se ele aprovaria, só posso elogiar. Abraço forte!

Mônica Menezes disse...

Lidi, linda entrevista. Continue, querida poetisa, continue. Beijos

Nívia Maria Vasconcellos disse...

Caro Inácio, parabéns pelo espaço. Lidi, minha sócia, minhas felicitações por suas respostas que transmitem sinceridade e espontaneidade. Já lhe disse e repito: ai se eu tivesse uma editora... :) Grande abraço.

Enzo Figueredo. disse...

Eu sou aluno dela;sempre saio de suas aulas impressionado,assim como,igualmente,fiquei com tamanha sensibilidade posta por ela para encerrar esta entrevista.

Paulo André disse...

Lidi, pertence a um grupo seleto de grande sensibilidade. Aos poucos vou descobrindo seus escritos. Eles me tocam de forma pungente. Abraço, Lidi.

Anônimo disse...

Parabéns a Lidi, excelente e lúcida entrevista, concordo com o que escreveu Eliana. Abs

LISI disse...

Sou suspeitísssima para falar, afinal esta moça é minha amiga-irmã.Mas de qualquer forma, não posso deixar de afirmar que mandou muitíssimo bem!PARABÉNS sempre e sempre!!

Ângela Vilma disse...

Parabéns, Lidi! Gostei demais de suas respostas: demonstram leveza e ao mesmo tempo firmeza diante de um indiscutível amor pela literatura. Um grande abraço.

Aleandro Senna disse...

Parabéns a Lidiane Nunes pelo Poemas
e Inácio sempre descobrindo Sangue Novo na nossa Poesia Baiana

Abraços Cavaleiro de Fogo...

Bárbara disse...

Lidi, adorei a entrevista. Muito autêntica.
Parabéns, amiga. Orgulho-me muito de você!
Bjs!

Senhorita B. disse...

Uma honra ser citada por esta menina tão legal e talentosa!
Parabéns pela entrevista, Lidi!
Bjs

Vitor Nascimento Sá disse...

Lidiane, não adianta: quem escreve, um dia, quer ser lido. Natural que chegue a vontade de publicar e acho que blogs são ferramentas excelentes para este fim. Mas as antologias virão, os livros virão. Ou não é ainda um sonho de todo escritor ter o livro (de papel) circulando nas livrarias? De qualquer forma, você tem razão: não dá pra imaginar um mundo sem literatura, sem poesia. Diante da velocidade, a sensibilidade da poesia precisa se adaptar, precisar utilizar como instrumento de crescimento aquilo que viria para matá-la – a máquina, a internet etc.
Parabéns Lidiane, parabéns Inácio.

Lidi disse...

Obrigada ao JIVM pelo espaço, pela oportunidade que me concedeu e aos amigos que comentaram a entrevista. Adorei ler cada palavra de vocês. Obrigada mesmo. Um grande abraço.

Dandinha disse...

parabéns Lidi!
Descobri hoje seu blog.Gostei do que escreve.Gosto de poesias, o poeta/poetisa é livre para interpretar e escrever os sentimentos do mundo...
abraços Darcy(prima)