
Em 5 de junho de 2009, Damário Dacruz esteve em Maracás para participar do projeto Uma Prosa Sobre Versos. Foi um momento muito bonito. Damário sabia cativar platéias e seus versos curtos surtem um forte efeito em quem ouve. O Grupo Concriz fez um belo recital e tirou lágrimas do poeta do Pouso da Palavra.
Terminado o evento, fomos para uma pizzaria, onde conversamos bastante. Percebi que o poeta tossia sem parar e fumava sem parar. Confesso que não tive bons pressentimentos e, na qualidade de uma pessoa amiga e sincera, falei para ele que deixasse aquele diabo, como é que podia um poeta como ele, com uma namorada tão elegante, com dois belos filhos, se entregar para uma porcaria como o cigarro. A namorada concordou. Damário também. Mas puxou logo outro assunto. Fui insistente e pedi para que fizesse um esforço no sentido de largar o cigarro. Ficou em silêncio. Continuamos nossa noite de confraternização. No dia seguinte o poeta de “Todo risco” partiu com sua namorada para Salvador, no ônibus das seis da manhã.
Uns dez dias depois, recebi um e-mail de Damário, informando-me que na viagem de volta sentira-se muito mal, que, apesar do frio, suara muito. E que procurara um médico que fez um diagnóstico muito grave, mas que só poderia ser comprovado após uma série de exames. Passou uma semana. Passou um mês e nada de receber notícias do Damário. E foi através de terceiros que soube que ele estava com câncer no pulmão. Não tive coragem de ligar para ele. Tentava e não conseguia. Algo me travava.
Então liguei para João de Moraes Filho, em Salvador; para Cleberton Santos, em Feira de Santana; e para Gabriel Gomes e Ricardo Prado, em Salvador, convidando-os para ir a Cachoeira visitar o poeta Damário Dacruz. João não pôde ir, mas os outros todos toparam.
No dia seguinte, 4 de outubro de 2009, saí de Jequié com Linda e nossos dois filhos, Moisés e Gabriel; Cleberton saiu de Feira de Santana com Rosa, o bebê João Cleber e a mãe de Rosa (sogra de Cleberton); e Ricardo, Gabriel e Lis, saíram de Salvador.
Almoçamos em Cachoeira e passamos a tarde com Damário, que nos recebeu com a sua costumeira hospitalidade. Falou-nos de como estava lidando com a doença, de como o médico estava impressionado com sua reação à quimioterapia, passando as mãos nos cabelos, mostrando-nos que os seus cachos estavam todos ali, coroando sua cabeça de querubim. Passeamos por todo sobrado. Recitou para nós alguns poemas seus. Deu um carrinho para meu filho Gabriel. Pegou o João Cleber nos braços. E encerramos o nosso encontro ouvindo o Damário ler poemas de Manoel de Barros. Assim foi o meu derradeiro encontro com o poeta Damário Dacruz. Um homem que amava a poesia e que lutou pela vida até não mais lhe restar força.
Pois é, poeta, cheguei da Pedra Só e recebi a notícia de sua passagem. O poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos, o fotógrafo Ricardo Prado e meu compadre Gabriel Gomes haviam ligado durante o dia, mas eu estava na roça. Mais adiante a gente se encontra, quiçá “nos favos de mel das europas/ ou no estrume das vacas leiteiras”. Parabéns por ter deixado esse planeta mais bonito, parabéns por ter cumprido as quadras de sua vida com poesia.
JIVM