terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

SANGUE NOVO - GABRIELA LOPES



O PROCESSO CRIATIVO COMO FORMA DE VIVER – GABRIELA LOPES nasceu em Salvador, em 1991. Viveu parte da infância em São Paulo e no final da década de noventa retornou à cidade natal. Desde cedo demonstrou sensibilidade com as palavras e gosto pelas artes e sempre contou com o incentivo dos pais, que são professores. Ao entrar na Universidade Federal da Bahia, no curso de Letras Vernáculas, em 2009, criou coragem para mostrar seus textos para o mundo com o blog Pintei a inocência da realidade com cores primárias (http://loveberrytales.blogspot.com/). O seu jogo com a escrita foi um crescimento natural de competência e interesse, que hoje se tornou uma escolha de vida.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – Qual o seu conceito de poesia?

GABRIELA LOPES – Se pensarmos de uma forma objetiva ou acadêmica, a poesia é o tratamento das palavras, isto é, trabalha com a linguagem para se criar uma mensagem estética. Mas o que seria a estética? A arte em si? Esses limites dentro das discussões da arte e da poesia são sempre difusos. O que eu posso afirmar é o conceito de poesia baseado no meu conhecimento empírico como leitora e criadora. Poesia é uma forma de ver o mundo dentro de um jogo de repensar aquilo que parece obvio para o outro e transformá-lo em algo inédito, é perceber o que está nas entrelinhas das situações, pessoas, objetos. Se pedíssemos a alguém para desenhar um gato, cada um desenharia de uma maneira diferente, a poesia é justamente essa observação da minha própria subjetividade e daquilo que me cerca.

JIVM – Para o poeta alagoano Lêdo Ivo, o poeta tem dois deveres essenciais: dar um sentido à vida e uma forma à realidade. E para você, quais são os deveres essenciais do poeta?

GL – O dever essencial do poeta é observar, anotar, assistir. O poeta é o telespectador da vida. Porém não é um telespectador passivo, o poeta também assume o papel de cineastra de um filme que é a própria vida. Experimenta de várias formas, corta, edita tudo que vê para finalizar. Trabalha com a imaginação e com a visão não tão obvia dos fatos, é quem consegue traduzir a subjetividade humana em palavras.

JIVM – quando foi que você se descobriu poeta? Lembra do primeiro livro de poemas que lhe marcou? Qual a importância da leitura na formação de um escritor? Quais são seus autores referenciais? E o que anda lendo, atualmente?

GL – Sempre gostei de ler poesia, mas por conta de algumas inibições quando mais nova, demorei a me aventurar a escrevê-la, comecei pela prosa poética e só ao entrar na faculdade de Letras consegui me aventurar. Ao fazer isso, percebi que a poesia já estava em tudo que escrevia ou na forma como vejo o mundo, então não sei dizer ao certo quando me descobri, mas sim, quando comecei a expor a minha poesia. Não lembro ao certo qual foi o meu primeiro livro de poemas, mas lembro de um diário que eu escrevi diversos poemas de Cora Coralina, cada página tinha um trecho ou os poemas inteiros. Á partir dela comecei a ler vários outros, e os que mais me marcaram além de Cora foram Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa e Mário Quintana na poesia, e Caio Fernando Abreu e Hilda Hilst na prosa . A leitura desses poetas influenciou na minha produção textual como uma bricolagem, um pedaço de cada, um pedaço de mim, um pedaço do outro e quanto mais bagagem eu tenho, mais confiante me sinto como poeta. A leitura funciona como o fortalecimento do escritor. Atualmente, estou me desafiando nessas férias a ler em espanhol Como agua para chocolate da Laura Equivel.

JIVM – Como você analisa a discussão da forma e do conteúdo na poesia? Qual a importância do conhecimento das técnicas de metrificação para o fazer poético? E letra de música é poema? E o que define um texto como objeto de realização da arte poética?

GL – Forma e conteúdo se completam. Ou melhor se suplementam. Quando funcionam de formas equilibradas, forma dando razão a conteúdo e vice-versa, a poesia se torna mais rica. Como o uso da métrica, que permite uma sonoridade e equilíbrio no poema quando bem utilizada, mas isso depende da proposta, porque até a desconstrução da métrica é uma forma válida de construir a arte poética. Letra de música é uma manifestação poética, pois pretende passar pelo processo da oralidade que é diferente da leitura da poesia, entretanto muitos poemas são musicados, então penso que a interpretação pode ser mudada de acordo com o tom da voz ou a melodia. Música é um recurso e uma forma de ver a poesia entre tantas possíveis. O texto se torna um objeto de realização poética quando há possibilidades de interpretação da subjetividade. É a provocação na leitura e o efeito no leitor que transformam a poesia em uma arte, uma comoção ou uma ruptura consigo mesmo.

JIVM – E agora, Gabriela? Como andam o cravo e a canela? Da sua janela, a lua é um requeijão ou uma esponja redonda? Quais os projetos dessa jovem escritora? Já pensa em publicar o primeiro livro? E o que mais?

GL – Cravo e Canela só no chá da tarde. As vezes sinto que a lua nem aparece no céu ou está resplandescente demais... Pensar no futuro é sempre algo angustiante e ao mesmo tempo intrigante. Tenho tentado escrever duas histórias, talvez contos, talvez romances, ainda estão se construído como ideias. Quero trabalhar com escrita e com imagem, roteiro de cinema, romance, poesia. Nada certo ainda. O que sei é que preciso do processo criativo como forma de viver.

2 comentários:

Gildeone dos Santos Oliveira disse...

Seja Bem-vinda Gabriela ao Sangue Novo.

Assim é a vida, a constante criação!
Parabéns!
Abraço.

Mazé Anunciação disse...

Gabriela, tão jovem e já tão ciente do seu ofício. Parabéns. Beijinhos.