Por José Inácio Vieira de Melo
Estilhaços de um ser fragmentado ou explosão de vozes
que saíram do casulo, Outros eus é um
livro que caminha, o tempo todo, em direção à unidade do ser. São tantos “eus”
em forma de “mim” que aparecem neste caderno especular, que as letras chegam a
adquirir feição própria, estampando no olhar do leitor o somatório de eus que
conjugam Érica Azevedo.
Sair do casulo para enfrentar o mundo é um grande
fascínio, porém cheio de riscos e, certamente, ninguém passa impune por essa
viagem. No que se refere à sua escritura, Érica traça um caminho através de
textos curtos, revelando-se uma expoente do minimalismo. Escreve como quem
pinta um autorretrato à exaustão, utilizando sempre os mesmos matizes. Parece não
ser por falta de outras opções cromáticas, mas por uma necessidade de se
refazer naquelas mesmas cores em que confia, mesmo que esteja perdida em meio
às suas escolhas. Mas quem está na busca é por que ainda não encontrou. E quem
encontrou? Quem se encontrou? Assim, Érica primeiro se estranhece para depois
se reconhecer, mas logo em seguida vem um novo estranhamento e, sucessivamente,
outros eus se vão configurando.
Vozes, que representam um desencontro, ecoam por todo
mapa do livro. Através dos retalhos de uma tempestade, chega-se à sua
“Intimidade”: “Meu quarto é uma extensão / do lodo / e do gozo / do meu corpo”.
Como o poeta itabirano, Érica também é gauche,
tem um olho torto que a leva “por velhas estradas” até chegar “a um ponto
morto”, sua herança e ressureição. E abre as pernas para a fecundação – é
preciso que nela algo se inscreva, é
preciso renovar o mundo, mesmo que, em “Instantes”, “Uma bala / perpasse meu
peito / bem devagarinho... // e sigo cheio de morte / pela vida”. Eis o
imponderável: prosseguir com tantos eus em torno de mim.
Prefácio do livro Outros eus (Editora Kalango, 2013)
2 comentários:
Obrigada, Inácio!
Inácio, obrigada por me apresentar o livro desta poeta. Gostei da poesia dela.
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