terça-feira, 21 de dezembro de 2010

JIVM - NOTURNO


Um Natal cheio de Paz para todos nós.
Saúde e sorrisos no Ano Novo.
Poesia e pássaros por toda a existência.

Abraços.

JIVM


NOTURNO



A minha noite é imensa dentro da sua largura,
e de um canto a outro é cheia de grilos –
deuses do Oriente que cantam para as estrelas
que se deleitam e dançam seu brilho para mim.

A minha noite é silente e calma – uma tempestade
que avança na imensidão dos meus abismos
como vermes a roer minha carne e meu prazer.

Dentro da minha noite tem uma vaca
que é sagrada e é um templo, uma igreja:
o seu chocalho é o sino que a todo instante
anuncia a vida e me convida para o agora.

A minha noite é enorme e dentro dela cabem
as mil e uma noites, bilhões de estrelas
e toda a poesia.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

SANGUE NOVO - ANDRÉ GUERRA



O ENCONTRO CONSIGO, A CONTEMPLAÇÃO DA ETERNIDADE – ANDRÉ GUERRA Nasceu em 1982, em Salvador, onde reside. É formado em Letras Vernáculas pela Universidade Federal da Bahia. É professor de Literatura brasileira voltada para o vestibular e, como tal, afirma que na sala de aula, apesar do direcionamento ao vestibular, sempre há espaço para explorar as belezas que vão muito além de uma mera prova. André Guerra é um poeta da essência, que faz poesia em busca de si mesmo. Vamos, então, conhecer um pouco desse poeta que alça vôo à eternidade.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – André, o que lhe move a fazer um poema? Onde você pretende chegar com a sua poesia?

ANDRÉ GUERRA – Um poema é a minha maneira de estar no mundo, de quebrar amarras, de mergulhar na vida pela arte. E a arte é a prova concreta e irrefutável da essência positiva do homem. Com a poesia pretendo chegar a mim mesmo e contemplar a eternidade.

JIVM – Você é professor de Literatura. De que maneira a poesia entra na sala de aula? Como os alunos a recebem? A poesia contemporânea da Bahia é apresentada para esses jovens?

AG – A sala de aula é um campo aberto para o contato com a poesia, em sua grande parte voltada para o vestibular, é verdade, mas sempre há espaço para explorar as belezas que vão muito além de uma mera prova. Assim, desde Camões, Augusto dos Anjos, os tantos Andrades, da poesia, Manuel Bandeira, Cecília, Vinícius, João Cabral, Ferreira Gullar, Ruy Espinheira Filho, Myriam Fraga, Paulo Leminski, Arnaldo Antunes, José Inácio Vieira de Melo ganham vida eterna nas conversas com os alunos.
Vez por outra ainda tenho a grata recompensa de encontrar jovens amantes e fazedores de poemas.

JIVM – Como a poesia chegou em sua vida? Qual o primeiro livro de poemas que leu? Quais as suas grandes influências?

AG – Pelo que me lembro, meu primeiro contato com a poesia se deu aos oito anos, quando minha mãe disse para mim o famoso poema de Casimiro de Abreu. Nunca esqueci. Lembro também de sentir um fascínio muito grande pelo filme “Sociedade dos Poetas Mortos”. Desde então venho aprendendo a escrever. Nesse processo, algumas pessoas me indicaram caminhos da poesia. Professores, como Paulo Monteiro e Antônia Herrera, e amigos como o querido José Inácio, de cuja poesia sou admirador.
Quanto às influências, destaco Carlos Drummond, Fernando Pessoa, João Cabral de Melo Neto.

JIVM – Nestes tempos de fragmentação da identidade e do elogio à especialização, à velocidade, ao tecnicismo, fazer e ler poesia é perder tempo?

AG – É como diz Paulinho da Viola: “mas é preciso viver, e viver não é brincadeira não...” Com as atribulações e demandas contemporâneas, ler e fazer poesia requer um momento de escolha, de entrega. Eu particularmente sinto falta de mais momentos para dedicar-me a essa prática. Se não tomarmos cuidado, a maquinização é capaz de ofuscar uma manifestação vital para que haja algum colorido em meio à “selva” em que vivemos.

JIVM – Qual a relevância de participar de uma coletânea de poetas como é o caso desse projeto Sangue Novo? E no mais, o que anda fazendo no reino das artes? Algum livro pronto?

AG – Para mim é uma grata oportunidade participar desse projeto. Admiro, além da sua poética, Inácio, sua dedicação ao universo da poesia. É preciso fibra para desempenhar um papel como o seu no cenário atual.
Tenho, sim, um livro pronto. Quem sabe esse projeto me inspira a levá-lo às vias de fato.

TRÊS POEMAS DE ANDRÉ GUERRA

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LUZES DA CIDADE


As luzes da cidade dizem tanto...
Que é natal nos comércios e avenidas,
que há fome no fogo dos malabares
e desejos em letras coloridas

Há rezas e comércio nos altares
luminosos de impérios catedrais.
Nesta ribalta de sonhos vendidos
as luzes da cidade dizem tanto

com suas neuróticas sinaleiras:
param a vida, param automóveis.
O homem multiplica sua sombra,

se parte, se reparte, se divide.
Colorido pelos letreiros frios
vive na sombra, morre em preto e branco.



“OFF-ROAD”


Sou um bicho da cidade.
Da luz só me disseram postes e semáforos
e me agrada a sombra dos toldos.

O cheiro do asfalto quente,
ao meio-dia,
sufoca e empana meus olhos.

Às vezes a saudade aperta
e quero voltar a caminhar sob o sol
numa lembrança de ser.

Todo fim de tarde namoro as flores que sobraram na feira.

Eu quero tanto enxergar por trás daqueles muros...



METONÍMICO


Diz-me o que me transborda
O bordado que não cessa
Porque não cabe num copo
A linha que me atravessa

E na fazenda marcada
Sua virgem tez derramada
Desnuda o ponto na sobra
Desdobra o copo nas águas.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

ANTONIO MIRANDA ENTREVISTA O POETA JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO - VI FLIPORTO - 2010



O escritor Antonio Miranda, Diretor da Biblioteca Nacional de Brasília, entrevista o poeta José Inácio Vieira de Melo durante a FLIPORTO 2010 em Olinda, Pernambuco, em 14 de novembro de 2010. O poeta baiano nascido em Alagoas fala sobre seu último livro Roseiral e de sua trajetória poética a Antonio Miranda, para o Portal de Poesia Iberoamericana.
Videomaker: Nildo Barbosa Moreira
Site: http://www.antoniomiranda.com.br/

terça-feira, 30 de novembro de 2010

OLINDA, IPIAÚ E JEQUIÉ


Em novembro fui convidado para participar de três eventos: a VI Festa Literária Internacional de Pernambuco – Fliporto, que aconteceu em Olinda, de 12 a 15 de novembro; a V Semana de Letras de Ipiaú – SELETI, no Campus XXI da Universidade Estadual da Bahia - Uneb, na cidade de Ipiaú, no dia 19, o evento contou com a participação do Grupo Concriz, da cidade de Maracás, que fez um recital com poemas de meu livro Roseiral; e a V edição do projeto literário O Poeta Vai à Escola do Colégio Municipal Alíria Argolo, em Jequié, que me prestou uma bela homenagem. Um mês de muitas alegrias. Compartilho aqui algumas imagens desses momentos tão especiais.
JIVM

Selma Vasconcelos, JIVM, Luciana Lyra e Alessandra Leão - VI Fliporto - Olinda

José Inácio Vieira de Melo e Ronaldo Correia de Brito - VI Fliporto - Olinda

José Inácio Vieira de Melo e Marcus Accioly - VI Fliporto - Olinda

José Inácio Vieira de Melo e Grupo Concriz - V SELETI - Ipiaú

sábado, 27 de novembro de 2010

JIVM - EU QUERIA SER ELIZEU MOREIRA PARANAGUÁ



EU QUERIA SER ELIZEU MOREIRA PARANAGUÁ


Eu não queria ser John Malkovich
nem muito menos Ruy Espinheira.
Queria mesmo era ser Elizeu Moreira Paranaguá,
o Conde dos Lajedos, o Pássaro de Pedra.

E, então, sairia por aí catando pedras,Adicionar imagem alimentando-me da sua energia
e jogando-as na cabeça dos ignaros
para despertar a aurora das ideias.

Eu não queria ser John Malkovich,
não, definitivamente,de nenhuma maneira,
não queria ser Luis Antonio Cajazeira
que não cabe em si nem em todo o Cosmo.

Eu queria ser Elizeu Moreira Paranaguá,
que não é nada e, por isso mesmo,
cada passo seu é cheio de possibilidades.
Não tem rumo certo – é rota em aberto.

Eu queria mesmo ser esse ser
que vive a bater pedras – uma na outra –
a extrair delas o fogo do invisível:
a chama sagrada da poesia.

E depois eu falaria de Nietzsche,
seria seu profeta mais alucinado,
o super-homem, o superpateta,
a cravar a flecha na Maçã.

Nesses tempos de indagação,
eu, sendo Elizeu, filho da orfandade,
mataria meu pai e proclamaria
a Pós-Idade da Pedra Sagrada.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

O FOGO SAGRADO DA POESIA

José Inácio Vieira de Melo

Aparentemente marcada por um discurso filosófico disparatado, a poesia de Elizeu Moreira Paranaguá é uma das mais peculiares do cenário poético contemporâneo da Bahia.
A impressão que se instaura ao começar a leitura de O Fogo do Invisível (Salvador: Selo Letras da Bahia, 2006) é de desordenamento. Isso se dá, talvez, por conta do uso incessante de anáfora, figura de linguagem da repetição, no percurso de todo o livro, a exemplo do poema de abertura “A forma da unidade”: "Somos nós a sombra/ da Unidade para a Unidade/ de todas as coisas/ e de todos os sentidos/ como todas as coisas/ e todos os sentidos/ não têm forma nem peso,/ como todas as coisas/ e todos os sentidos/ têm algo que se dá nome,/ como todas as coisas/ têm princípio e fim (...)".
Em um poema que afirma que "todas as coisas/ e todos os sentidos/ não têm forma nem peso", o desenvolvimento não poderia ser de outra maneira, se não um jogo que provocasse uma desconexão. Assim, a aparente desordem já começa a se justificar, e é essa desordem que confere uma aura à poética de Paranaguá, pois, na verdade, é regida por uma ordem tão fora do eixo do ordinário que conduz o leitor para uma esfera de estranhamento, criando um clima de descoberta, uma vez que pisando em sendas desconhecidas: "Eu sempre fico/ nu para Deus,/ mas ele nunca/ ficou nu para/ o sentido terrível/ do meu ser".
O poder imagético sugerido por seus versos faz com que o leitor esqueça as repetições, que logo são transmudadas em ritmo e conferem andamento às partituras líricas do bardo de Curralinho, plagas onde nasceu também Castro Alves, o poeta da liberdade. O Fogo do Invisível nasce da energia das pedras. Paranaguá, tal qual um deus, bate as pedras do caos e acende as faíscas do fogo do invisível e convida o leitor a fazer parte da fogueira dos tempos. Mas, para isso, é preciso desarmar-se dos conceitos e preconceitos para arder na linguagem pura que Paranaguá oferece: "Chegar à luz/ cega de Deus".
Como bem observa Foed Castro Chamma, poeta paranaense de Pedra da transmutação, Elizeu Moreira Paranaguá é o Ladrão do Fogo. Ele extrai o fogo das pedras – gado que cria em seu lajedo poético – e, à maneira de Prometeu, compartilha as chamas da criação com seus semelhantes.
Em Os passos em volta, livro de prosa do poeta português Herberto Helder, está presente a seguinte afirmação: "O amor e o desespero e a desordem – isso é a nossa parte do jogo". Essa assertiva define bem o processo de criação de Elizeu, porque o que fica na superfície da sua proposta estética é uma enorme força intuitiva a expressar o desespero: "Desejo violento/ vontade sangrenta/ de abraçar/ e colorir/ as asas/ da borboleta".
Ao aproximar-se do final do livro, o sentimento inicial de estranheza diante da desordenação ainda se faz presente. E é esse porte esquisito que dá consistência à linguagem de Paranaguá, pois é a ‘desordem’ que nos arrebata e nos conduz para algo extra-ordinário, para algo que está para além da ordem do dia.
Agora, ao fim desse concerto de experimentações vivenciadas pelo poeta, as impressões não perdem o tom, mas adquirem outros coloridos, e a sensação é de estar-se a freqüentar um novo sentimento que transcende a razão e que, por isso, não há como explicá-lo, nem mesmo através da metafísica, pois "Não há metafísica/ para quem guarda pedras/ a espantar o mundo". O curioso é que Elizeu Moreira Paranaguá busca os fundamentos para a sua poética na razão, no discurso filosófico, seara que tenta entender tudo e tudo explicar.
Mas o que acontece, efetivamente, em sua poesia, é um mergulho nos abismos do delírio. Paranaguá é, sem sombra de dúvidas, o Quixote baiano: o Conde dos Lajedos, que vive a bater pedra contra pedra, a extrair o fogo sagrado da poesia.

Resenha sobre o livro O Fogo do Invisível, publicada no site Cronopios em 9 de dezembro de 2008

sábado, 20 de novembro de 2010

CENTAURO: A NATUREZA DO HOMEM

Por Raquel Naveira


Não há melhor imagem para o conflito da natureza masculina do que o centauro: homem e cavalo, razão e instinto, delicadeza e brutalidade. Amor imoderado pelo vinho, pela carne e pelas mulheres. Virilidade contida. Sabedoria incompreendida. Natureza monstruosa e selvagem que não se pode reprimir.
Moacyr Scliar escreveu um romance com esse título lindo: Centauro no Jardim. O livro conta a história do centauro Guedali, nascido no interior do Rio Grande do Sul, filho de uma pacata família de imigrantes judeus russos. Guedali cresce solitário, excluído e o isolamento o leva ao hábito da leitura. Inteligente, sensível e culto, é ele quem conduz a narrativa de realismo fantástico eita a partir do dia de seu 38º aniversário, comemorado entre amigos. A figura do centauro ilustra a divisão étnica e religiosa dos judeus, um povo perseguido por sua singularidade. Ouso dizer que o centauro é um alter-ego de Moacyr Scliar, ele mesmo judeu, ávido leitor, que galopa por paisagens de mistério e magia.
No poema “Amor Mitológico”, imaginei o amor entre uma ninfa e um centauro:

Sou uma ninfa menina,
Dessas que habitam o oco das árvores
E enfeitam os cabelos com boninas,
Sou simples e delicada,
Quase não falo,
Prefiro tocar flauta
E sentir paz quando me calo,
Mas qual não foi a minha sina,
Apaixonar-me por um centauro
Que corria disparado na ravina!
Era linda a sua crina dourada,
O seu torso de homem claro
E seu faro logo me descobriu
Como se eu fosse uma égua na baia,
Por mais que eu deseje que esta paixão saia,
Ela me domina:
Fogo que veio no vento,
No sopro de suas narinas,
Quando eu o quero manso e angélico,
Ele é bruto
E me bate com os cascos;
Quando eu o quero viril e bélico,
Ele larga o arco
E me afaga com palavras doces
E desde então
Vivo vagando pela campina
Com o corpo doído
E a alma machucada
Pois nunca pensei que fosse tão difícil
Amar ou ser amada.


Lendo A Arte da Poesia, de Ezra Pound, encontro uma definição incrível de poesia: “A poesia é um centauro. A faculdade intelectiva e aclaradora que articula palavras deve movimentar-se e saltar juntamente com as faculdades energéticas, sensitivas e musicais.” Penso,

O poeta é um centauro:
A mente de homem
Aclara ideias,
Articula palavras
E as pernas de cavalo,
Cheias de energia,
Saltam no ímpeto da emoção.

O poeta é um centauro:
Alimenta-se de carne crua,
Bebe vinho,
Embriaga-se
E depois chora
Arrependido
Fazendo brotar fontes
Com a pancada de seus cascos

O poeta é um centauro:
Uma força bruta,
Que rapta,
Violenta,
Cega
E depois se põe a serviço
Do bom combate.


Dante Milano, poeta carioca, que sabe como expressar a dor da existência, escreveu um poema chamado “Fuga do Centauro”. O “centauro” surpreende a mulher, mistura de santa e prostituta, com um embate impiedoso, cheio de luta e prazer. Terminado o ato sexual, ela, carente, com lágrimas na face, implora que ele fique, que não a abandone, mas ele foge. Transcrevo trecho:

Fui beijá-la e dei dentadas.
Havia sangue em seu gosto.
Espanquei-a com carícias,
Massacrei-a de delícias.
Arrastei-lhe o corpo exposto,
Nua, o gesto descomposto,
E pus-lhe as patas no rosto.
Ela dava gargalhadas.


A Infância do Centauro é um livro de poemas emocionantes do jornalista José Inácio Vieira de Melo. Quantas surpresas. Quantos “ninhos de centauros”.Como o poeta é um centauro: galopa, galopa, galopa, transcendendo a ele mesmo e às suas explicações. O poeta galopa o território de sua infância, a sua principal metafísica. Caminha pelas ruas da Bahia, conduzindo seu filho Moisés, reconhecendo seu próprio pai na memória da íris de seu filho. E oferece a ele a sua herança de centauro.
Em outro ponto, o sensual centauro declara:

Vinde, minhas éguas, luzindo na imensidão!
No ritmo de vossas ancas é que se inaugura
A saga do meu império e os nomes do meu nome:
Cavaleiro de Fogo, Centauro Escarlate.

Poesia pura, feita de músculos, pegada, coração e melancolia de centauro. Centauros e poetas são mesmo temíveis aos mortais.


Artigo publicado no livro Caminhos de bicicleta (Miró Editorial, 2010), de Raquel Naveira, nas páginas 21 a 25.

Raquel Naveira é poeta, professora e Mestre em Comunicação e Letras. Dentre vários livros, escreveu
Abadia (1996) e Casa de Tecla (1999), ambos finalistas do Prêmio Jabuti de Poesia.

domingo, 14 de novembro de 2010

SANGUE NOVO - JANARA SOARES


A POESIA COMO FÉ
– JANARA Laíza de Almeida SOARES nasceu em Barreiras, em 1989. Morou por 19 anos no município de São Desidério. Cursa Letras Vernáculas no campus IX da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, em Barreiras, onde reside.
Para Janara a poesia é uma profissão de fé e ela mantém essa chama bem acesa para compartilhar com aqueles que têm fome de encantos. Mantém o blog Minutos de Silêncio e Outras Fantasias (http://minutosefantasias.blogspot.com/). Vamos ler as palavras de Janara, musa do Oeste, que extrai sua poesia da essência das coisas.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – Janara, o que é poesia? Para que serve a poesia? O que lhe leva a fazer poesia? Onde pretende chegar com sua poesia?

JANARA SOARES – Não sei o que é poesia e tenho uma preguiça enorme de tentar definí-la. Engraçado fazer algo que não conseguimos definir. Eu vejo a poesia como fé: você não sabe o que é Deus, mas acredita e ora e prega. Sei, no entanto, para quê ela serve. A poesia serve pra uma infinidade de coisas, ao contrário do que os estudiosos falam sobre a arte, pois tudo o que o ser humano faz serve para algo. Em primeiro lugar, a poesia serve para a intenção do poeta, podendo ser íntima (externar angústias, anseios, tristezas e felicidades) ou coletiva (poesia com cunho social, como força de transformação). É uma forma especial de comunicar aquilo que ninguém vê. Em segundo lugar, a poesia serve para o leitor. Todas as pessoas têm sentimentos intensos, mas nem todas conseguem falar ou escrever sobre eles; aí entra a poesia. Não sei o que me leva a fazer poesia e essa pergunta me inquieta, fazendo com que eu me sinta meio irresponsável... Normalmente os poetas têm uma idéia definida sobre seu “ser poeta”. Eu ainda estou construindo isso. Eu ainda me sinto muito surpresa quando alguém afirma que leu algo que escrevi, e mais surpresa ainda quando gostam. Agora me chega a possibilidade de ser lida, talvez reconhecida. É meu período de amadurecimento.

JIVM – Você lê muito? Qual o primeiro livro que leu? O que está lendo? Quais são seus escritores referenciais? Quais os seus poetas preferidos?

JS – Sempre li muito, exageradamente, quase compulsivamente. Não sei se isso foi bom ou ruim para mim, já que a leitura era algo solitário e eu nunca tinha com quem compartilhar minhas experiências. Demorou um pouco para que eu criasse um círculo social. Não lembro do primeiro livro que li, mas lembro do que tenho como mais antigo em minha memória. É um livro infantil chamado “O Diabo na Noite de Natal”. Não me recordo o autor, mas lembro que misturava o folclore brasileiro com personagens que conhecia do cinema (o Capitão Gancho, Superman, Carlitos). Acho que gostei mesmo do livro por causa da última frase: “E em algum lugar, um relógio batia meia-noite”. Hoje em dia minhas leituras são mais acadêmicas, o que me enche de raiva. Tenho medo de perder a habilidade e a alegria que eu tinha para leituras voltadas para o prazer. Na prosa, sempre li os clássicos brasileiros, principalmente o Machado de Assis, que me proporcionou muitas risadas na minha adolescência. Um dia descobri o Gabriel Garcia Marquez e me apaixonei totalmente. Os contemporâneos eu só encontrei na universidade. Quanto aos poetas, comecei a ler e fazer poesia por volta dos dez, onze anos. Amava Álvares de Azevedo, e ainda amo. Fiquei sabendo que existia um tal de Vinícius de Moraes quando encontrei um livro velho e surrado lá em casa, sem capa e sem nome. Lia sempre e adorava. Fui descobrir que era ele, anos depois, quando vi o Soneto de Separação em um livro didático. Conheci Baudelaire, Rimbaud, Oscar Wilde, e vários outros estrangeiros em quem eu me espelhei naquela época. Hoje tenho Ferreira Gullar como um dos meus preferidos.

JIVM – Para uma garota que escreve versos e mora no Oeste, a mais de mil quilômetros da capital, qual o papel que a internet desempenha? E na sua criação poética, como é que ela participa?

JS – A internet foi uma válvula de escape. Nunca tive vontade de mostrar meus poemas para pessoas conhecidas. Um dia, há alguns anos, fiz um blog e comecei a postar. Foi um alívio, como se eu estivesse tirando um peso das costas. O divertido é que sempre que via alguém escrevendo, sem querer mostrar, eu incentivava ao máximo para que espalhasse pelos quatro cantos sua obra. Hipócrita, não? Essa história de internet lavou minha consciência, pois eu podia publicar sem que pessoas conhecidas vissem meus poemas. Não foi bem isso o que aconteceu, mas tudo bem. Sendo um veículo rápido de informações, pude entrar em contato com novos poetas e perceber novas estéticas, o que renovou totalmente a minha forma de criar. Deus, eu tenho sonetos metrificados! Ainda não sei como eu conseguia fazer isso. Antes eu trabalhava mais; hoje é mais rápido, mais intuitivo. E antes eu não trabalhava, tendo, portanto, tempo para ficar horas num único poema.

JIVM – O fato de ser estudante do curso de Letras tem proporcionado a você um conhecimento mais profundo da literatura brasileira, sobretudo da contemporânea, ou esses assuntos são vistos apenas de passagem? Quais benefícios o curso de letras trouxe para a poeta Janara Soares?

JS – Eu caí no curso de Letras por acaso. Sempre quis fazer História e jamais tinha pensado em estudar Literatura. Para mim, Literatura era pra ser lida, e só. Entrei porque na época em que fiz o vestibular não havia curso de História e descobri que em Letras ensinavam Latim, que eu já estudava sozinha. Meu curso, na verdade, é mais rico nas disciplinas de Lingüística e de Educação. A Literatura não é estudada tão intensamente como eu esperava quando entrei no curso, mas quando acontece, é bastante gratificante. Conheci poetas que nunca teria conhecido se não estivesse na academia e, além disso, descobri as relações entre Linuguística e Literatura, o que me rendeu leituras imensamente ricas. As disciplinas relacionadas à Crítica Literária tiraram minha inocência na leitura de poemas e da Literatura em geral. Hoje tenho mais capacidade de inferir no texto, de ter uma posição quanto aquilo que eu leio. Não sei se isso é muito bom. Tenho agora mais bagagem para discernir as coisas, mas antes era mais mágico, era mais poesia.

JIVM – O que você anda fazendo? Já tem planos para publicação do primeiro livro? E o que mais?

JS – Estou terminando meu curso e planejando minha monografia. Quero fazer um trabalho sobre a relação do espaço, do território e da paisagem na criação literária, especificamente aqui, no Oeste Baiano. Quando sair daqui, pretendo fazer o mestrado imediatamente. Não quero ficar parada. Quanto à publicação de um livro, eu nunca pensei nisso, mas idéias estão começando a aparecer. Na verdade, minha primeira idéia de publicação seria uma antologia com os poetas levantados na minha monografia, com o intuito de promover a Literatura de nossa terra. Livro meu, mesmo, só estou começando a pensar agora.

TRÊS POEMAS DE JANARA SOARES

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SONHO


Sonhava que a luz não existia
e as cores eram cores por si só.
Podia tocá-las! E elas, densas,
Se desfaziam como algodão doce
lentamente lambido,
lentamente salivado.

Nesse sonho o azul royal
– antes tão aristocrata –
era liberto para amar
todos os vermelhos dos cardeais.

E a Inquisição não se importava.
Os seios não eram rosas, os seios;
eram girassóis dourados.
Cansados da delicadeza do veludo,
percorreram outros campos.
Mais ainda floridos, os seios.

Os sons tomaram formas
e meus olhos se alegraram:
como o Gato, o Dó maior me sorria.
Era vermelho intenso o Si menor
e voava feito águia.

E quando Morpheus resolveu me deixar
espantado pela chegada de Aurora
restou um cobertor no chão
e um rosto no espelho que eu quase desconhecia.
Voltei para a cama. A vida podia esperar.



MIGUEL


Ele chega trajando uma camisa parda
Caminhando com a paciência dos séculos
Cabelo caído numa face sem cor
Escondendo em seu olho os fins dos milênios.

Sem armadura, espada ou cota de malha
Sentou ao meu lado, forçando um sorriso.
Pediu uma cerveja, meio descontente.
No sereno da mesa desenhou um círculo.

– Cansei de Guerras, – me disse o arcanjo,
– muito trabalho, o pagamento é pouco.
Já vi de tudo. Só falta ser humano.

– E a glória? – Depende do ângulo.
Sorriu de novo, pediu outra cadeira...
Encheu mais um copo. Jorge vem chegando.



O GRANDE RIO


Minha porta está fechada.

Enquanto isso corre o boato
dos corpos sem coração.

Foram encontrados ontem
– às margens do grande rio –
molhados por tanto pranto
que as mulheres carpideiras
não se puseram a chorar.
Em cada peito um buraco
– como quando se planta uma árvore –
cada um, ali, perdido,
pedindo alguma semente.
Os joelhos estavam inchados,
das mãos corriam sangue e cera,
os pés calejados dormiam
o sono de toda uma vida.

Dizem nos botecos, à meia luz,
que há muito os corações já não existiam.
As pobres vítimas não eram tão pobres
se a morte sabe o que faz.

Dizem, como sempre, dizem
que os corações evaporaram,
não havia mais lugar ali
para um coração existir.

Dizem, como sempre acontece
quando aparece alguma notícia,
dizem que cada corpo trazia em si
um pouquinho do nada do inferno.
Que qualquer pedaço de vazio
é como uma maçã podre no cesto.

Minha porta está fechada.
Não quero ser encontrada
às margens do grande rio.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

ROSEIRAL DE JIVM NA FLIPORTO



Serviço
Evento: - lançamento de Roseiral
livro de poemas de José Inácio Vieira de Melo
Data: 12 de novembro de 2010
Horário:16 horas
Local: Tenda de autógrafos de Fliporto
Praça do Carmo - Olinda - PE
Entrada franca
Classificação etária: livre
Informações: (81) 3269-6134

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

SANGUE NOVO - GILDEONE DOS SANTOS OLIVEIRA



VIAGENS POR MUNDOS INFINITOS – Para GILDEONE DOS SANTOS OLIVEIRA, poeta nascido em 1986, no município de Retirolândia, na região sisaleira da Bahia, “a escrita não pode ser colocada dentro de uma camisa de força”. O escritor deve ter liberdade para expressar sua escritura e ser reconhecido por seu talento, não por predileções temáticas, como é comum na literatura brasileira contemporânea. Gildeone viveu toda a infância e parte da adolescência no campo. Atualmente mora num povoado a cinco quilômetros da sede do município. É professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira no Ensino Médio do Centro de Educação Santo Antônio (CESA). Fez graduação em Letras Vernáculas no Campus XIV da UNEB, em Conceição do Coité, e faz Mestrado em Literatura e Diversidade Cultural na UEFS, onde estuda a representação do sertão e do sertanejo na obra O Romance d'A Pedra do Reino, de Ariano Suassuna. Mantém o blog Curtindo Linguagens (www.gilsantoslinguagens.blogspot.com). Agora, vamos conhecer um pouco mais sobre este poeta que busca a poesia da vida em cada esquina e que entende que a Literatura proporciona viagens por mundos infinitos e traz grandiosas descobertas.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO
– O que é ser poeta? Por que ser poeta? Você também acha que “o poeta é um fingidor”?

GILDEONE DOS SANTOS OLIVEIRA – Muitas vezes me pergunto o que é ser poeta, outras vezes não sei se devo ser chamado poeta, são questionamentos comuns para todos que escrevem poesia, ou pelo menos que são iniciantes nessa prática. Mas, acho que ser poeta é buscar os versos da vida em cada esquina, é ser o leitor das coisas simples, é ser uma criança prodígio, tecendo e retecendo mundos que nos conduzem a olhares mais aguçados em relação à vida quotidiana. Pela poesia a vida quotidiana se torna mais (in)completa, aí cabe afirmar que, como Pessoa já proclamara, “o poeta é um fingidor”, finge a dor sentida, reinventa a própria dor e desmascara as dores não sentidas. Para mim a poesia veio como uma forma de reencontro, de busca de mim mesmo, de busca pelo humano que existe em mim. Aos poucos o gosto pela leitura e pela escrita me tomou, aí percebi que, pela escrita, posso ser um cavaleiro andante que cavalga moinhos de vento em busca de outros horizontes. Parodiando um verso de Alberto Caeiro, com a poesia percebi que da minha aldeia vejo o que se pode ver no universo.

JIVM – O fato de você ser do sertão confere algum crédito para a sua poesia? Ou, ao contrário, cria um certo ranço regionalista que tenta reduzir os escritores que vivem no nordeste a estereótipos cristalizados?

GSO – Bom, não tenho ainda uma publicação, o que torna difícil as pessoas fazerem um julgamento mais concreto da minha poesia. Mas, quem escreve do espaço onde estou inserido sofre sim com o ranço regionalista que reduz os escritores a estereótipos. Às vezes, mais do que a redução a estereótipos há a discriminação contra as pessoas que habitam nas pequenas cidades e povoados do sertão, como é o meu caso. Mas, aos poucos esses tabus vêm sendo quebrados. Uma poesia não deve ganhar ou perder crédito pelo lugar de onde o poeta escreve, essas fronteiras não faz mais sentido no contexto do século XXI. Aqueles que preservam esses ranços ainda vivem no período jurássico. Hoje, o que vale é o texto, a poesia deve ser julgada pelo que ela pode dizer ou não para quem se debruça sobre ela. A escrita não pode ser colocada dentro de uma camisa de força.

JIVM – Você é estudioso da obra de Ariano Suassuna, o que nos leva a uma dedução do seu cânone pessoal. Imagino que escritores como João Guimarães Rosa, Graciliano Ramos e João Cabral de Melo Neto devem figurar entre as suas principais referências. A minha inferência está correta? E quais outros prosadores e poetas contemporâneos você lê? Já ouviu falar do escritor Ronaldo Correia de Brito? Conhece a obra do poeta Alberto da Cunha Melo?

GSO – Correto, Ariano Suassuna, Guimarães Rosa, Graciliano Ramos e João Cabral de Melo Neto, fazem parte do meu cânone pessoal, somando-se a tantos outros. Escrevo poesia, mas a prosa toma muito mais tempo nas minhas leituras. Dos escritores contemporâneos, além de Suassuna tenho buscado ler Francisco J. C. Dantas o próprio Ronaldo Correia de Brito e Antônio Carlos Viana, nomes que trazem para literatura o sertão, o que me atrai muito enquanto estudioso do sertão e enquanto leitor apaixonado por esse espaço que é o mundo ser-tão. Na poesia estou lendo muito os versos de Ruy Espinheira Filho, Myriam Fraga, Antônio Carlos Secchin (sempre leio Drummond e outros também), e tenho entrado em contato com a poesia de José Inácio Vieira de Melo, recentemente acabei a leitura de Roseiral, gostei do que li. Quanto ao poeta Alberto da Cunha Melo só conheci sua obra esse ano quando entrei no Mestrado, tenho uma colega que estuda a poesia dele, a partir de então tenho buscado conhecer a poesia de Cunha Melo. Uma poesia forte, marcada pela mística da pedra sertaneja, dentre outros aspectos.

JIVM – Você mantém o blog Curtindo linguagens. Qual o papel que as mídias virtuais exercem na literatura contemporânea? O que acha dessa profusão de blogs? E voltando para o seu blog, mais especificamente, um trocadilho com o título: Qual a linguagem que você mais curte? E dentro da sua preferência, com quais outras linguagens mantém um diálogo profícuo?

GSO – As mídias contemporâneas são muito positivas, têm oferecido o espaço para muitas pessoas se expressarem e transmitirem suas produções. Ao mesmo tempo em que o espaço fica mais aberto muitas coisas sem substância acabam circulando também. A multiplicação dos blogs no geral é positiva, mas, é sempre bom lembrar, na internet encontramos coisas boas e coisas ruins, cabe ao leitor fazer a sua seleção de acordo com o que mais gosta. Para a literatura as mídias fazem um papel importante de levar a muitos jovens, a muitas pessoas, o acesso a textos que nunca chegaram através da escola. É um tanto irônico, mas moro numa localidade da zona rural de uma cidade que tem mais de 40 anos de emancipação política, mas ainda tenta abrir uma biblioteca pública que seja acessível a todos, a internet chegou primeiro do que a biblioteca. Sempre tive muitas dificuldades para ter acesso ao livro, mas com a ajuda de professores consegui despertar o gosto pela leitura e pela escrita. Foi com o acesso à internet e percebendo o potencial dela que veio a ideia do blog para divulgar meus textos, devo admitir que, às vezes, tenho até receio de publicar textos no blog.
Além da literatura, a música, a pintura, as artes plásticas como um todo me atraem muito. Apesar de o acesso a essas linguagens ficar dificultado pela pouca atenção que elas ganham aqui no sertão da região sisaleira. Mas, ainda tenho muitos sonhos de poder me expressar através dessas outras linguagens, como a música, por exemplo.

JIVM – E agora? O que pretende fazer? Sair pelos quatro cantos, berrando a sua louca verdade de poeta? Quando sai o primeiro livro? E esse mestrado?

GSO – Bom, agora estou seguindo meu caminho de cavaleiro andante que monta em seu Rocim, cansado da lida no sisal, mas revigorado pelas descobertas, e prossegue pelas veredas ásperas do sertão pedregoso, seguindo os passos apontados pela poesiamundo. Espero poder berrar um pouco a minha poesia, não sei se ela terá serventia para alguém, tomara que pelo menos incomode algum vizinho que me acha um louco devorador de livros. Estou firme no mestrado, amadurecendo como estudioso e como degustador da literatura e dos sertões. Além de buscar condições necessárias para encarar o mercado de trabalho (a poesia no Brasil não alimenta ninguém né!?). Quanto ao livro, tenho um projeto para publicar em 2011, com certeza dará tudo certo.

TRÊS POEMAS DE GILDEONE DOS SANTOS OLIVEIRA


Ilustração: Juraci Dórea



















GUERNICA DE CANUDOS

“Mas eram terríveis lances, obscuros para todo sempre. Raro tornavam os que os faziam. Aprumavam-se sobre o fosso e sopeava-lhes o arrojo o horror de um quadro onde a realidade tangível de uma trincheira de mortos, argamassada de sangue e esvurmando pus, vencia todos os exageros da idealização mais ousada. E salteava-os a atonia do assombro...”
Euclides da Cunha, Os sertões.


Em ruflar de tambores
epopéicos,
versos disparam-se
de bambus encanados,
encenados
coitados.

Canudos-de-pito,
fumados em meio a ventos
de secas tardes
em sol esturricante,
assaltante.

Canudos-de-pito
em dispersão vertical
sorvem da terra
seu líquido
maternal.

A terra
faz-se homem
no seio de capuabas
acuadas do sertão.

Estilhaços de raios
solares e luminosos
queimam
constitucionalmente
a raça da favela.

Tambores ruflam pela charmosa estação
por Virgulino assaltada.

Pelos trilhos progressistas
maquinalmente exercitados,
constitucionais patriotas
pintam, furiosamente,
o sabor da fúria
de Macambira.

Em explosões de corpos
Homo humanus.
Animais.
A Matadeira
persiste
no furor mirabolante.


Do alto, o Belo Monte.
A fotografia
de pastos
secos
em cinza de sangue.
No mato,
resta a história,
loucura e glória
do titã cambaleante.

Na segunda margem,
Cocorobó
em choro flamejante,
entre rostos e restos
da derrotada história,
o açude apadrinhado
espera sua glória.

Entre conselhos,
Conselheiros,
o sertão margeia,
o mar
numa terceira sinfonia,
clama pela pedra
enterrada
na Guernica da Bahia.



MEU PLANETA


O meu planeta
é menor que um alfinete,
tem oceanos vastos,
e o continente é habitado
por belas sereias
que se banham
dentro da minha
flor vermelha.

É por isso que minhas estrelas
tocam sonatas de dor,
e a lua chora
toda noite, gozando de amor.



REVERSOS


O Sol despeja seus tentáculos
raiando sobre a terra esbraseada.
Riscos enxadescos pairam na poeira,
sobre a face do redemundo.

Destoco as fibras
nos versos encourados
que cavalgam o jumento
em reversos de Sol.

Pela caatinga branca,
asas revoam os pontos pretos
encharcados de bagaços.
No brinde das andanças,
cachaças florescem
as pegadas do curral.

Sob o cacto em espinhos,
tentáculos solares,
percorrem os pares
pelo mundo da pedra-flor.
Meus versos decantam o caminho
pisado em reversos de Sol.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

A DÉCIMA SINFONIA DE CARLOS MOISÉS



Hoje, 26 de outubro de 2010, meu filho primogênito, Carlos Moisés, está completando 10 anos. Festa em meu coração!
E um dia ouvíamos a “Sinfonia Coral” (Nona Sinfonia) de Beethoven, sentados à beira de uma fogueira, lá na fazenda Pedra só e, de repente, quando os cantores líricos cantavam a “Ode à Alegria” de Schiller, Moisés trouxe do âmago do seu ser o poema “Sinfonia”. Não sabia ele que havia feito um hai-kai.
E era uma vez, Moisés, Gabriel e eu galopando dentro da tarde – meus filhos e eu entrando na boca da noite. Passamos num açude para dar água aos nossos cavalos. E havia uma árvore cheia de garças, e as estrelas começavam a brilhar no firmamento. Foi quando Moisés trouxe para nós o seu poema “Galope”. E seguimos galopando, noite adentro.
Parabéns, Carlos Moisés, meu filho. Vida longa, Saúde, Paz, Amor e Poesia. Que a claridade do Sol e da Lua alumie seu caminho.
A minha gratidão a Deus, à Linda, aos deuses, às divindades, aos santos, às musas, aos poetas pela dádiva da companhia de meus filhos.

JIVM



DOIS POEMAS DE CARLOS MOISÉS SOGLIA DE MELO


S I N F O N I A

É cheio de estrelas
o silêncio do maestro.
Dança a lua cheia.


G A L O P E

Minhas mãos feitas de garças
agarram-se à saia do Universo:
cavaleiro, galopo estrelas.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

JIVM - ROSEIRA



ROSEIRA


Quanto pode durar a planta breve?
Da pétala à cabeça – a extensão:
um verão de calipígias mulheres,
rosas rubras que despertam prazeres.

Espinhos, espalhadas folhas cantam,
cantam e atravessam, de ponta a ponta,
as pedras das linhas duras do sonho.
Dentro, as mulheres, rosas escandidas.

As mulheres respondem com o orvalho
e caminham, de saltos altos, por
cima e saltam, inocentes, a morte.

E recebem obeliscos linheiros
e cantam os gemidos espondeus
e florescem nas formas da beleza.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

terça-feira, 12 de outubro de 2010

SANGUE NOVO - FABRÍCIO DE QUEIROZ VENÂNCIO



DESAGUAR EM VERSOS – FABRÍCIO DE QUEIROZ VENÂNCIO, 23 anos, nasceu em Salvador e é estudante da Universidade Federal da Bahia. Tem poemas publicados na antologia Diversidade e Convivência (EDUFBA 2009). Participou da Praça do Cordel e da Poesia, na Bienal do Livro da Bahia (2009), e editou e participou da primeira edição da revista Na Borda da Xícara. Mantém o blog http://www.fabriciodequeiroz.blogspot.com/ Para ele a escritura é um desaguar em versos. Vamos conhecer um pouco do manancial de Fabrício, poeta que inventou a borda da xícara e que borda versos no tecido do universo.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – Por que você escreve?

FABRÍCIO DE QUEIROZ VENÂNCIO – Escrever para mim é como um desaguar. E algumas coisas só consigo desaguar em forma de verso. Comecei dessa forma e com as leituras e o tempo fui aperfeiçoando o modo de escrever, quanto a rima, forma, etc. Contudo, não mudei essa minha peculiaridade de "desaguar em versos".

JIVM – Você e dois amigos, Max e Darlan, publicaram o primeiro e único número da revista Na borda da xícara. De quem foi a idéia? E por que a revista homenageia o poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos? E por que não publicaram outras edições?

FQVNa Borda da Xícara surgiu de uma reunião semanal fracassada que eu e mais três amigos, Max, Lucas (este compõe a primeira edição da revista) e Vítor, tínhamos para discutir nossas leituras, uma espécie de café literário/filosófico. Em mais uma falta semanal dos dois últimos, Max propôs a construção de uma revista e eu simplesmente topei. No mesmo dia esquematizamos o formato, dividimos atividades, resgatei um nome que Max sugeriu para um blog a alguém e posteriormente convidamos Darlan para ajudar.
O livro Como Se (do Cajazeira) foi encontrado num sebo pelo Vítor, que nos levou e imediatamente nos apaixonamos. Depois de um tempo, já com a revista em editoração, conseguimos o número dele e ele foi muito atencioso em nos encontrar (na época ele só conheceu o Max) e dar conselhos... Depois se afastou e justificou que não queria que a revista ficasse com a "cara dele", mas com a nossa. Cajazeira foi nossa grande descoberta na Bahia, nos abriu as portas para que conhecêssemos o que de bom se faz de poesia por aqui, é um excelente poeta e sua atenção e ações foram fundamentais na elaboração da revista. Eu e o Max somos fãs dele.
Não continuou, por enquanto, por questão financeira. Nós não queríamos, na época, encher a revista com propaganda de patrocinadores, o que nos afastou da idéia da busca de patrocínio privado. Resolvemos bancar e contar com os escritores para isso. Pagamos boa parte do custo da primeira edição indo a eventos vender a revista, o que dá um trabalho enorme. Nenhum de nós três vive pela literatura e decidimos não ter esse trabalho novamente e tentar custear a revista via edital de cultura. Passamos da primeira fase em um destes, mas não deu. Vamos continuar tentando via edital.

JIVM – Você lê muito? Qual foi o primeiro livro que leu? O que está lendo agora? Quais são os seus escritores referenciais?

FQV – Leio muito sim e não lembro o primeiro livro que li, acho que foi algum fininho que encontrei pela biblioteca da escola onde fiz meu ensino fundamental, em Cajazeiras.
Lembro do primeiro que me marcou, que foi As Brumas de Avalon, de Marion Z. Bradley. Atualmente estou lendo um livro técnico e, enfim, Dom Quixote.
Acredito que vou apreendendo um pouco do que vou lendo. Inicialmente lia poetas de língua inglesa como T.S. Eliot e Willian Blake. Eliot influenciou muito na forma em que escrevo. Depois fui descobrindo os clássicos e agora estou no Brasil e na Bahia, com Ruy Espinheira, Ivan Junqueira, Cajazeira Ramos, etc.

JIVM – Como você analisa a cena poética de Salvador? Os eventos e projetos são muitos e há espaço para todos? Ou a coisa é escassa? Os poetas são unidos ou se degladeiam? E você nesse meio, como age?

FQV – Pra mim é difícil dar uma resposta confiável a essa pergunta, já que aos espaços, quando frequento-os, chego, assisto, digo alguns "ois" e vou embora. Não por falta de crédito, ou qualquer coisa assim, mas por timidez mesmo. Não me lembro de 'degladeamento' em meio impresso ou digital. Sei de algumas rixas vindas de rumores, mas nada escancarado.
Eventos existem. Agora, quando vou, comumente me deparo com as mesmas pessoas (não que não goste delas) e, quando há novas, são normalmente da Academia. Carecemos de um Projeto para de fato tentar começar a universalizar a poesia... Tem tanta gente "jogando versos" por aí. Deve-se ter precaução para que não se forme um meio caduco que fica escrevendo para si mesmo. Poesia é arte e portanto uma das formas de procurar entender a si e ao mundo.

JIVM – E agora? Uma nova revista? A publicação do primeiro livro? E o que mais?

FQV – Aguardando editais para Na Borda da Xícara, acho que a revista merece. Quanto a livro não me sinto a vontade com os meus poemas para colocá-los em um livro, não ainda. Existe uma proposta de uma editora para eu e o Max escrevermos um livro juntos, já que temos alguns poemas "a quatro braços", mas estamos vendo isso ainda. É algo, no mínimo, ousado de se fazer.
Mas, pelo lado de cá, ousadia não falta.

TRÊS POEMAS DE FABRÍCIO DE QUEIROZ VENÂNCIO


















PAREDES


"O que são as lembranças senão o idioma dos sentimentos?"
Júlio Cortázar


Pia no canto do quarto um rádio empoeirado,
a maresia, convidada pela janela aberta,
passeia livre pelos objetos usados.

A parede, sebosa e caduca, não se recorda do branco;
o brilho faz parte da memória da madeira
e a cadeira já não serve para sentar.

Um último pio do vento e pronto, arma-se a lembrança:
risos de criança que giram num carrossel envelhecido,
ciranda de velhos que rezam em redor do epitáfio.



IDADES


O silêncio está enferrujado na dobradiça.
Atrás da porta repousa o tempo,
na cabeceira está o pó e no pó
repousam minhas peças velhas.

O terço foi atacado pelas feras,
a cruz tem a ferrugem da descrença;
a santa imagem repousa só
e seus pés estão descalços.

No chão o retrato das minhas eras,
o cabresto que me atém ao luar.
Junto à janela a marca do suor,
a lembrança do eco de passos no vitral.

As traças me fazem lembrar a vida,
os ratos me causam o comichão.
Eu, não sou mais que uma saudade
carregada por um vento já cansado;

um vento farto de mim.



FORMIGAS NO TETO


Faz pouco sentido enquanto espero
a música ainda toca triste, baixo
os amigos estão na sala, sorrindo
estamos indo em silêncio
e nosso choro não pode ser escutado.

Enlouquecemos mas somos ignorantes,
no nosso jogo só existem dois.
No formigueiro brincamos de ciranda,
chamamos de belo o perigoso
de desejo o que é costume.

Pensamos e sorrimos ao mundo,
Somos sebosos e é suja nossa fé,
nosso respiro é gorduroso:
só no cochilo há o alívio,
só na parede a distração.

Não somos mais que este quarto,
Este odor de cigarro abafado,
esta porta de ferro fechada:
Sua ferrugem é o nosso carisma
e nossa canção está no teto.

As formigas caminham,
concentram a nossa atenção.
A tela se apaga pelo desuso,
o banho quente cessa.
E o silêncio, lentamente, nos sufoca.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

VERÔNICA DE VATE - MYRIAM FRAGA



MYRIAM DE CASTRO LIMA FRAGA nasceu em Salvador, Estado da Bahia, a 09 de novembro de 1937, filha de Orlando de Castro Lima e Beatriz Pondé de Castro Lima.
Tendo iniciado suas atividades literárias publicando assiduamente em revistas e suplementos literários, estréia em livro com Marinhas, poesia, no ano de 1964, pelas Edições Macunaíma – editora especializada em publicações de tiragem limitada e de alto padrão gráfico, sob a orientação artística do gravador Calasans Neto.
Com poemas traduzidos para o inglês, francês e alemão, tem participado de diversas antologias no Brasil e no exterior. É citada em várias publicações nacionais e estrangeiras, entre elas: Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira, de José Paulo Paes e Massaud Moisés (1968); Grande Enciclopédia Delta Larousse (1972); Enciclopédia de Literatura Brasileira, de Afrânio Coutinho, (1990), História da Literatura Brasileira, de Luciana Stegagno Picchio (1997) e Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras:1711-2001, por Nelly Novaes Coelho (2002).
Tem participado, como escritora convidada, de inúmeras conferências e seminários no Brasil e em outros países, como: I Encontro da Poesia Brasileira – Semana Joaquim Cardoso, em Recife (1981); II Bienal Nestlé de Literatura, em São Paulo (1984); Brasilian Writters Project, nos EUA (1985); 40º Congresso da União Brasileira de Escritores – UBE, em São Paulo (1986); III Bienal Nestlé de Literatura, em São Paulo (1986); 5º Encontro Nacional de Acervos Literários Brasileiros, PUC – Rio Grande do Sul, (2001); Simpósio sobre a Cultura e a Literatura Caboverdianas, em Mindelo, Cabo Verde (1986); Encontro Poesia em Lisboa, em Lisboa (1998); III Congresso Nacional de Escritores, em Pernambuco (2002); Colloque Jorge Amado, Sorbonne, em Paris (2002); Encontro sobre poesia, na Universidade de Rennes, França (2005), Festival Literário de Parati – FLIP, Rio de Janeiro (2006); Festival Literário de Porto de Galinhas, Recife (2007); Semana do Brasil, em La Rochelle, França (2007);
Eleita por unanimidade membro efetivo da Academia de Letras da Bahia, tomou posse no dia 30 de julho de 1985, passando a ocupar a cadeira de n.º13, que tem como patrono o poeta Francisco Moniz Barreto, na vaga de Luiz Fernando Seixas de Macedo Costa. Foi membro do Conselho Federal de Cultura, do Conselho Federal de Política Cultural, e do Conselho Estadual de Cultura, do Conselho Editorial da Fundação Cultural do Estado da Bahia. e do Conselho da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia-FAPESB.
Diretora Executiva da Fundação Casa de Jorge Amado desde sua instituição, em julho de 1986, vem se dedicando, igualmente, à área de Administração Cultural. Entre 1980 e 1986, esteve à frente de projetos pioneiros na Fundação Cultural do Estado da Bahia, quando coordenou a Coleção dos Novos e foi responsável pelo projeto de criação do Centro de Estudos de Literatura Luiz Gama, hoje Departamento de Literatura.
Membro do Conselho da Associação Baiana de Imprensa – ABI, além de manter colaboração em revistas e jornais, foi responsável pela coluna Linha D’Água, sobre assuntos culturais, publicada aos domingos no jornal A Tarde, de Salvador, de 1984 a 2004.
Recebeu os seguintes títulos e prêmios: Prêmio Arthur de Salles (Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia, 1969); Prêmio Casimiro de Abreu (Secretaria da Educação e Cultura do Estado do Rio de Janeiro, 1972); Medalha Castro Alves (Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel. Salvador, 1984); Medalha do Mérito Castro Alves (Secretaria de Educação e Cultura do Estado da Bahia, 1984); Personalidade Cultural (União Brasileira de Escritores – UBE. Rio de Janeiro, 1987); Medalha Maria Quitéria (Câmara dos Vereadores da Cidade do Salvador, 1996); Prêmio COPENE de Cultura e Arte (COPENE. Salvador, 1996); Troféu Catarina Paraguaçu (MAM e TGM. Salvador, 1997); e Prêmio Alejandro José Cabassa (UBE. Rio de Janeiro, 1998).

BIBLIOGRAFIA

POESIA
Marinhas (Ed. Macunaíma, Salvador, 1964); Sesmaria (Ed. Imprensa Oficial da Bahia, Prêmio Arthur Salles, Salvador, 1969); O livro dos Adynata (Ed. Macunaíma, Salvador, 1973); A ilha (Ed. Macunaíma, Salvador, 1975) O risco na pele (Ed. Civilização Brasileira, Rio, 1979); A cidade (Ed. Macunaíma, Salvador, 1979); As purificações ou o sinal de talião (Ed. Civilização Brasileira, Rio, 1981); A lenda do pássaro que roubou o fogo (Ed. Macunaíma, Salvador, 1983); Six poems, trad. Richard O’Connell (Ed. Macunaíma, Salvador, 1985); Os deuses lares (Ed. Macunaíma, Salvador, 1992); Die Stadt, trad. Curt Meyer-Clason (Ed. Macunaíma, Salvador, 1994); Femina (Ed. Casa de Palavras/ COPENE, Prêmio COPENE Cultura e Arte, Salvador, 1996) e Poesia Reunida (Ed. Academia de Letras da Bahia / Assembléia Legislativa, 2008).

ANTOLOGIAS
Cinco poetas (Ed. Macunaíma, Salvador, 1966); Antologia da moderna poesia baiana (Ed. Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 1967); 25 poetas da Bahia (Ed. DESC, Salvador, 1968); Sete cantares de amigos (Ed. Arpoador, Salvador, 1975); Antologia de poetas da Bahia, em alfabeto braile (Ed. da Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1976); Em carne viva, org. Olga Savary (Ed. Anima, Rio de Janeiro, 1984); Poetas contemporâneos, org. Henrique Alves (Ed. Roswitha Kempf, São Paulo, 1985); Simulations, org. Richard O’Connell (Atlantis Editions, Flórida/USA, 1993); Sincretismo – a poesia da geração 60, org. Pedro Lyra (Ed. Topbooks, Rio de Janeiro, 1995); Modernismo brasileiro, org. Curt Meyer-Clason (Druckhaus Galrev, Berlim /ALEMANHA, 1997); Poésie du Brasil, org. Lourdes Sarmento (Ed. Vericuetos, Paris/FRANÇA, 1997); Poesia em Lisboa (Ed. Casa Fernando Pessoa/P.E.N. Club Português, Lisboa/PORTUGAL, 1998); A poesia baiana no século XX, org. Assis Brasil (Ed. Imago, Rio de Janeiro, 1999); Águas dos Trópicos, org. Beatriz Alcântara e Lourdes Sarmento (Ed. Secretaria de Cultura do Estado do Ceará, 2000); Antologia de Poetas Brasileiros, sel.org. Mariazinha Congílio (Universitária Editora Ltda, Lisboa, 2000); A Paixão premeditada, org. Simone Lopes Pontes Tavares (Ed. Fundação Cultural do Estado da Bahia, 2000);Poetas da Bahia século XVII ao século XX, org. Ildásio Tavares (Ed. Imago/Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, 2001); Antologia da Poesia Brasileira, org. Xose Lois Garcia (Ed. Laiovento /Santiago de Compostela/Galiza, 2001); Companhia de Poetas, org. José Alberto Pinho Neves (Ed.Funalfa, Juiz de Fora, Minas Gerais, 2003); Perfil Grécia - em Poetas do Brasil, org. Stella Leonardos (Ed. Francisco Alves/Rio de Janeiro, 2004); Geopoemas (Geopoems), org. Luiz Angélico da Costa (Ed. da Universidade Federal da Bahia –EDUFBA, Salvador, Bahia, 2007).

BIOGRAFIAS
Flor do sertão
(Ed. Macunaíma, Salvador, 1986), Uma casa de palavras (Fundação Casa de Jorge Amado/Casa de Palavras, Salvador, 1997), Leonídia, a musa infeliz do poeta Castro Alves (Fundação Casa de Jorge Amado/Casa de Palavras/Copene, Salvador 2002).

INFANTO-JUVENIL
Castro Alves (Ed. Callis, Coleção Crianças Famosas, 2001); Jorge Amado (Ed. Callis, Coleção Crianças Famosas, 2002); Jorge Amado (Ed. Moderna, Mestres da Literatura, 2003); Castro Alves (Ed. Moderna, Mestres da Literatura, 2004); Luiz Gama (Ed. Callis, A luta de cada um, 2005); Carybé (Ed. Moderna, Mestres da Pintura, 2005); Graciliano Ramos (Ed. Moderna, Mestres da Literatura, 2007)

*

Amanhã, a cidade de Maracás terá o momento de culminância do projeto Uma Prosa Sobre Versos com a presença de Myriam Fraga, diva da poesia baiana. E para receber a grande poeta, mais uma vez o Grupo Concriz preparou um recital com uma antologia de poemas da convidada, com o qual receberá a poeta de Femina, em homenagem calorosa. Calorosa é uma palavra que se aplica bem para a comunidade maracaense, que apesar de viver na terra do frio, sabe passar afetividade e calor humano. Todos que participaram e participam do projeto, dos organizadores à platéia, estamos de parabéns. Que na noite de amanhã, às 19:30 hs, o Auditório Municipal de Maracás esteja repleto de pessoas, como é de costume. E que em 2011 o projeto seja mais forte ainda.
Mas a jornada poética de Myriam não para por aí, na noite do dia seguinte, sábado, 9 de outubro, encerrará as atividades do projeto Travessia das Palavras, que vai acontecer na Câmara Municipal de Vereadores, da cidade de Jequié, às 19:30 hs. O projeto vai contar também com a presença do Grupo Concriz, que brindará a poeta com um belo recital. Na mesma noite, Leonam Oliveira, um dos coordenadores do projeto Travessia das Palavras e atual presidente da Academia de Letras de Jequié, dará posse ao novo presidente da instituição, Adilson Gomes, assim como aos novos membros da ALJ: Ivan Estevan Ferreira, José Inácio Vieira de Melo, Julio Pereira Lucas Neto, Maribel Oliveira Barreto e Zilda Freitas.


ARS POETICA


Poesia é coisa
De mulheres.
Um serviço usual,
Reacender de fogos.

Nas esquinas da morte,
Enterrei a gorda
Placenta enxundiosa

E caminhei serena
Sobre as brasas
Até o lado de lá
Onde o demônio habita.

Poesia é sempre assim:
Uma alquimia de fetos,
Um lento porejar
De venenos sob a pele.

Poesia é a arte
Da rapina.
Não a caça, propriamente,
Mas sempre nas mãos
Um lampejo de sangue.

Em vão,
Procuro meu destino:
No pássaro esquartejado
A escritura das vísceras.

Poesia como antojos,
Como um ventre crescendo,
A pele esticada
De úteros estalando.

Poesia é esta paixão
Delicada e perversa,
Esta umidade perolada
A escorrer de meu corpo,

Empapando-me as roupas
Como uma água de febre.



POEMA


O canto é o mesmo.
Farol de destinos
Decapitados.

Brancos os campos
De sol mais claro
E os olhos baços.

Fita de pedras
Circundando o exato.

No corpo de vidro
As serpentes se agitam,
E as enxadas na pedra
Reconstroem o espaço.

Antes era o silêncio,
Água tranquila
Onde nadavam peixes,

Antes era o não ser,
A flor boiando escura.

Hoje existe apenas
A fadiga da pedra,
O sono amortecido das esferas,

E o corpo se descosendo,
Inexoravelmente.


MYRIAM FRAGA

terça-feira, 5 de outubro de 2010

JIVM NO TERÇAS POÉTICAS - REGISTRO


Abaixo alguns registros fotográficos da minha passagem por Belo Horizonte, onde participei do Terças Poéticas, em 28 de setembro, projeto semanal coordenado pelo poeta Wilmar Silva. Além do Terças Poéticas, gravei o programa Tropofonia, da Rádio UFMG Educativa, apresentado por Wilmar Silva, Francesco Napoli e Cristina Borges, que vai ao ar às segundas-feiras, às 23 horas. O Tropofonia é uma loucura! O programa dedicado à minha poesia será veiculado na próxima segunda, dia 11 de outubro. Para assistir basta entrar no site da Rádio UFMG Educativa (http://www.ufmg.br/online/radio/) e ouvir a programação em tempo real.
JIVM

"Não é nada fácil ser juiz da própria loucura"

"Meu coração é mesmo a rosa viva"

"A vida é uma lavoura de pólvora"

José Inácio Vieira de Melo e Wilmar Silva

Wilmar Silva, Regina Mello e JIVM

JIVM e Paulinho Pedra Azul

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

JIVM - SOLUÇO


Foto: Ricardo Prado

SOLUÇO


Tem uma voz que grita o tempo todo em meus ouvidos:
– Esse menino é todo diferente dos outros!

(E eu ainda não sei onde é que está essa diferença
nem muito menos o que fazer com essa diferença.
Eu não sei nem pra onde ir com a minha diferença).

E agora eu só sei te falar desse labirinto.
E este soluço que saiu da casa do medo
está cheio de coragem.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

sábado, 25 de setembro de 2010

JIVM NO PROJETO TERÇAS POÉTICAS



Serviço
Evento: Terças Poéticas - José Inácio Vieira de Melo
& homenagem a Francisco Carvalho
Data: 28 de setembro de 2010
Horário:18h30
Local: Jardins Internos do Palácio das Artes,
Belo Horizonte - MG
Entrada franca
Classificação etária: livre
Informações: (31) 3236-7400

terça-feira, 21 de setembro de 2010

POESIA SEM “MÁSCARA DE FERRO”

Por Francisco Carvalho


Depois de ler o admirável posfácio de Eliana Mara Chiossi, não sei o que mais poderia dizer a respeito do livro de poemas de José Inácio Vieira de Melo: Roseiral de palavras que nos transmitem os conteúdos da modernidade literária do tempo presente. O poeta rebelde à linguagem transcendente dos versejadores que celebram o mundo, como se fosse uma casa de portas e janelas abertas para os líricos de meia tigela. Eliana Chiossi mergulha nos labirintos de sua dicção poética para decifrar os enigmas de sua personalidade literária. Ela nos fala, com extraordinária densidade crítica, do “abalo mais visível do seu universo interior, presente nas combinações semânticas” que conferem “a seus versos uma tonalidade rubra, passional e incendiária”, num processo de associações que incendeiam as ideias, à maneira de coivaras que ardem nas fazendas sertanejas para a plantação das primeiras chuvas.
Destaca a composição dos sonetos brancos, impressos na segunda parte do livro. Afirma que o poeta tem profunda admiração “pelos poemas de forma fixa. Estudioso assíduo da metrificação, escolhe os versos decassílabos” para exprimir sensações e desenvolver temas sobre acontecimentos telúricos que homenageiam o “feminino”. O poeta exibe comportamento viril na sua poesia, e o faz de maneira explícita, com palavras e ideias precisas.
Os sonetos brancos me parecem ótimos, além de serem uma forma de sair da “máscara de ferro” do velho soneto petrarquiano, tão vilipendiado pelas gerações modernas. Os sonetos brancos me agradam pela flexibilidade formal, principalmente os rimados sem o rigor dos sonetistas à moda antiga. Acredito que a boa poesia pode estar presente nos versos rimados e metrificados. Inúmeros poetas poderiam servir de exemplo a essa afirmação, desde que não se leve demasiado a sério o vício de rimar dos parnasianos.
JIVM é um poeta admirado pelos amantes da poesia, medida ou sem medida. Não se apresenta como poeta radical. Pelo contrário, é bastante flexível para compreender que os tempos mudaram, e que os poetas têm de estar atentos para o rumo da onda. Na página 75, ele confessa abertamente: “Em seus largos cômodos,/ habitam uma enorme solidão/ e muitas vontades de vida.” na página 70 ele nos diz que sua “noite é imensa dentro da sua largura/ e de um canto a outro é cheia de grilos”... Na página 69, faz o elogio das nádegas femininas, sem levar em conta o falso moralismo dos que tentam esconder os privilégios da sexualidade.
Lendo JIVM, ficou-me a impressão de que ele tem grande afinidade com a obra poética de Gregório de Matos, conhecido pela alcunha de O Boca do Inferno. Segundo Augusto de Campos, “Gregório de Matos continua a esperar que as gerações mais novas arranquem a “máscara de ferro” dos sonetos de piedade e arrependimento que, em nome do ‘humano’ e do decoro, lhe afivelam à genial boca do inferno”.
Estou convencido de que JIVM é um poeta de expressão nacional, na medida em que usa a linguagem do povo na realização de seus poemas. Ele recorre à sensibilidade dos humildes para exprimir os sonhos de cada um de nós.


Francisco Carvalho é poeta e ensaísta. Publicou, entre outros, Quadrante Solar (1982) – Prêmio Nestlé de Literatura, Girassóis de Barro (1997) – Prêmio Fundação Biblioteca Nacional, Memórias do Espantalho (2005) e O Sonho é Nossa Chama (2010).

Resenha publicada na revista virtual Verbo21 número 133, agosto 2010 (http://www.verbo21.com.br/v3/)

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

SANGUE NOVO - ÉRICA AZEVEDO



ASTRO FLAMEJANTE – ÉRICA AZEVEDO nasceu em 1983, na cidade de Santo Estevão,onde ainda reside. É professora de Língua portuguesa e literatura brasileira, graduada em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), mesma Instituição em que se especializou em Estudos Literários. Para Érica poder transformar um momento ou um novo olhar num poema é algo tão necessário quanto o próprio respirar. Vamos, então, conversar um pouco com essa jovem poeta que, como Florbela Espanca, acredita que ser poeta é “ter cá dentro um astro que flameja”.

JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO – A poesia atende a quais demandas suas? Ou é você que atende a um chamamento premente, “mais urgente do que a vida”, como diria o poeta Alberto da Cunha Melo? Ser poeta é uma missão ou um projeto?

ÉRICA AZEVEDO – Eu não escolhi ser poeta, quando percebi já estava escrevendo, ou melhor, já sentia a necessidade de escrever. Este é o meu modo de aquietar as angústias que alimentam meu ser, minha forma de tornar suportáveis as dores humanas. Poder transformar um momento ou um novo olhar num poema é, para mim, algo tão necessário quanto o próprio respirar. Florbela Espanca afirmou que ser poeta é “ter cá dentro um astro que flameja”. E esse astro às vezes me queima, outras me extasia... E assim continuo escrevendo e vivendo. Posso dizer, apenas, que não criei o projeto de me tornar poeta, mas a busca pelo aperfeiçoamento enquanto poeta tornou-se um projeto.

JIVM – Um poeta ao publicar um livro e colocá-lo à venda, nas livrarias, pretende o que, já que tem consciência de que não vai vender quase nada? E você, sente-se animada com essa realidade? Por que abraçar esse ofício?

EA – Sabe quando lemos um poema e sentimos que ele expressa algo que não conseguiríamos organizar em pensamentos e ficamos emocionados durante a leitura? Enquanto poeta me sinto realizada duplamente quando percebo que um poema escrito por mim tocou alguém. É isso que me move. Por isso, mesmo sabendo que um livro não alcançaria uma grande quantidade de venda o desejo de publicar permanece.

JIVM – Em que momento de sua vida você foi tocada pela poesia? Qual o primeiro livro de poemas que você leu? O que está lendo agora? Quais os poetas que lhe conduzem às esferas do delírio?

EA – Não conseguiria precisar quando comecei a me encantar pela leitura e produção poética, mas devo ter rabiscado meus primeiros versos aos 13 anos, ou um pouco antes. O primeiro livro de poesias que li foi uma seleção de melhores poemas de Bandeira. São muitos os poetas que me conduzem ao êxtase literário: Bandeira, Quintana, Pessoa, Florbela Espanca, Drummond, Paulo Leminski, Ruy Espinheira Filho, entre tantos outros. Permaneço lendo esses poetas que me encantam profundamente e buscado conhecer as produções do momento seja através dos livros ou dos blogs.

JIVM – O que pode ser feito para que o povo brasileiro, sobretudo os jovens, leia mais? E em que medida a leitura pode contribuir para a evolução do ser e, consequentemente, da sociedade?

EA – A leitura é essencial para ampliar nossos conhecimentos, para nos aprimorar enquanto ser humano, uma vez que através dela entramos em contato com experiências que nos mostram distintas “realidades” e com isso podemos nos aprimorar enquanto pessoas. Penso que quando os jovens perceberem o prazer que a leitura pode proporcionar a resistência que se tem a ela se tornará ínfima. Creio que somente por meio da descoberta do prazer da leitura pode se conseguir que as pessoas leiam mais.

JIVM – O que você anda fazendo? Já tem algum projeto de publicação de livro? E o que mais?

EA – Estou trabalhando como professora de língua portuguesa e de literatura. Estou selecionando alguns poemas para publicar muito em breve. Também tenho escrito alguns contos e enveredar pela poesia e prosa simultaneamente é um desafio que estou disposta a abraçar.

TRÊS POEMAS DE ÉRICA AZEVEDO
















CHUVA


Ouço a chuva que passa
intensamente
e molha tudo em sua volta
seus sinais de presença
desperta-me numa noite fria
que eu queria apenas dormir.

Insisto em fechar os olhos,
ela insiste em cair
e pelos meus ouvidos atravessa o telhado
e molha os sonhos
que adormecem em mim.



RETRATO


Minha alma carrega um peso
que não permite
ajuste.

Todo Lugar é
lugar nenhum.

Meu corpo é uma vasilha sem forma
que me torna livre
como um pássaro
que não sabe voar.



DESTINOS


Num espaço
fechado
andando entre vozes
e dedos
persigo uma multidão
ao encontro de mim.

Até que a multidão
chegue ao fim.

domingo, 12 de setembro de 2010

JIVM - JARRO INDÍGENA


JARRO INDÍGENA


Flechas guaranis vieram falar
da superfície e desses arvoredos,
da luz, ventre da noite e mãe do dia,
e do rio que dessedenta os homens.

A fim de desdobrar certos estados
na palavra, a mulher anela o barro
da tarde: jarro tecido em imagens,
alucinados arcos-cintilantes.

O real é um todo obscuro e triste.
Nele ouvimos as demandas dos homens,
ventos que guardam grandes mãos vazias.

Assim bradam as flechas guaranis,
entre o duplo do espelho acendem tempo
e espaço, sendo sempre o estradar.


JOSÉ INÁCIO VIEIRA DE MELO

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

VERÔNICA DE VATE - ASTRID CABRAL



ASTRID CABRAL (FÉLIX DE SOUSA) nasceu a 25/09/36 em Manaus, AM, onde fez os primeiros estudos e integrou o movimento renovador Clube da Madrugada. Adolescente ainda transferiu-se para o Rio de Janeiro, diplomando-se em Letras Neolatinas na Faculdade Nacional de Filosofia, atual UFRJ, e mais tarde, após concluir os sete anos da Cultura Inglesa, como professora de língua e literatura norte-americana pelo Instituto Brasil Estados Unidos. Concluiu o curso de História da Arte/Carlos Cavalcanti, no Rio de Janeiro e estudou arte islâmica e bizantina na American University of Beirut. Freqüentou o Language Tuition Center de Londres, o Loop College e o Truman College de Chicago aperfeiçoando os conhecimentos de inglês. Lecionou língua portuguesa e literatura brasileira no ensino médio carioca e na Universidade de Brasília, onde integrou a primeira turma de docentes saindo em 1966 em conseqüência do golpe militar. Antes de afastar-se cursou o mestrado de letras concluindo todos os créditos exigidos. Em 1968 ingressou por concurso no Itamaraty, tendo servido como Oficial de Chancelaria em Brasília, Beirute, Rio e Chicago. Com a anistia, em 1988 foi reintegrada à UnB, passando a lecionar modernismo brasileiro, barroco e arcadismo no curso de graduação em letras. Ao longo de sua vida profissional desempenhou os mais variados trabalhos, fora e dentro da área cultural. Serviu na Embaixada do Brasil em Beirute e no Consulado Geral brasileiro em Chicago. Trabalhou vários anos no Arquivo Histórico do Itamaraty e no IBECC, órgão do MRE ligado à UNESCO. Detentora de importantes prêmios na área de poesia, figura em mais de quarenta antologias no Brasil e no exterior. Tem igualmente participado de movimentos ligados à oralização da poesia no Rio de Janeiro, tais como Poesia Simplesmente e Panorama da Palavra, além de outros. Idem de congressos e celebrações poéticas nacionais e internacionais. Colabora com assiduidade em jornais e revistas especializadas. Foi fundadora da Associação Nacional dos Escritores de Brasília e pertence ao PEN CLUBE do Brasil. Traduziu vários livros para a Biblioteca de Seleções e para a Editora Global, “Walden ou a Vida nos bosques” e “Desobediência Civil” de Henry David Thoreau. Viúva do poeta Afonso Félix de Sousa, com quem conviveu mais de 45 anos, é mãe de cinco filhos. Atualmente reside no Rio de Janeiro.

Obras publicadas:

Alameda (ficção) 1ª edição: GRD, Rio, 1963; 2ª edição: Editora Valer, Manaus, 1998
Ponto de cruz (poesia) Cátedra, Rio, 1979
Torna-viagem (poesia) Pirata, Recife, 1981
Zé Pirulito (história infantil) Agir, Rio, 1982
Lição de Alice (poesia) Philobiblion, Rio, 1986
Visgo da terra (poesia) Edição Puxirum, Manaus, 1986
Rês desgarrada (poesia) Thesaurus, Brasília, 1994
De déu em déu (poesia reunida) Sette Letras/Biblioteca Nacional, Rio, 1998
Intramuros (poesia) Secretaria de Estado da Cultura do Paraná, 1998
Rasos d’água (poesia) Co-edição Governo do Amazonas, Editora Valer, Manaus, 2003
Jaula (poesia) Editora da Palavra, Rio de Janeiro, 2006
Ante-sala (poesia) Editora Bem-te-vi, Rio de Janeiro, 2007
Antologia pessoal, Thesaurus, Brasília, 2008
Antologia/50 poemas escolhidos pelo autor, Edições Galo Branco, Rio de Janeiro, 2008
Sobre escritos/ Rastro de leituras (crítica literária) Editora da Universidade do Amazonas, Manaus. No prelo.

*

Ontem, Astrid Cabral participou do Projeto Com a Palavra o Escritor, na Fundação Casa de Jorge Amado, no Pelourinho, às 17 horas. Foi apresentada pelo poeta Luís Antonio Cajazeira Ramos. Amanhã, dia 10, será a vez da cidade de Maracás receber a poeta amazonense, em um grande evento, como soe acontecer na Cidade das Flores, com a participação sempre especial do Grupo Concriz. E no dia seguinte, sábado, 11 de setembro, encerrando a jornada poética de Astrid, ela irá participar do projeto Travessia das Palavras, em Jequié, a Cidade Sol, que também contará com a presença da turma boa do Grupo Concriz. E viva a Poesia!!!


PERFIL


Dona de casa
dona de nada
escrava de lavras
à terra amarrada.
Mãe de família
mãe de alegrias
entre lutos e sustos.
Jaqueira imensa
cheia de frutos.
Poeta nas horas vagas?
Poeta nas horas plenas
embora raras...
O mais, não vale a pena.



DAS COISAS


Algumas são perecíveis.
As comestíveis, por exemplo,
tão assimiláveis e semelhantes
nas urgências e desgastes do corpo
tão irmãs no destino decadente
mergulham conosco na voragem.

Outras são descartáveis
e se afastam de nós cada vez mais
rejeitadas por nossos gestos
rebaixadas a lixo e ainda assim
recicláveis com direito pleno
à metamorfose e reencarnação.

Grande parte das coisas
é de assombrosa resistência
matéria incólume pelas eras
muralhas e pirâmides de pedra,
pontes, arcos, e torres de ferro,
coroas de ouro e diamante.

Efêmeros seres em trânsito,
devemos conviver com presenças
tão duradouras que até diríamos
participantes da eternidade.
Destas mantemos distância
devido às incompatíveis esferas.

Abro o guarda-roupa e encontro
os casacos com que meu filho
enfrentou a neve de Chicago
e caminhou ao sol da Califórnia
a camisa de um ido Carnaval.
Restos de seu rastro no mundo.

Não fosse a vida humana
assim breve, impermanente
poderia vesti-los a qualquer instante
perfeitos, embora pendurados
bem mais de uma dezena de anos
nos ombros fantasmas dos cabides.

Como disse um amigo às vésperas
de seu embarque definitivo:
o mundo só se acaba pra quem morre.
Daí a sobrevivência das coisas.
Apesar da aparência precária
de mudez e paralisia, resistem.

Longo é o circuito de tantas coisas
Pequenas enquanto o tempo nos destrona
Derrubando-nos ao rés-do-chão.


ASTRID CABRAL